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Mensal entre 13 de agosto de 2010 e 31 de dezembro de 2012.

terça-feira, 1 de maio de 2012

Os naufrágios na rota da Índia entre 1500 e 1700: uma contribuição para o entendimento do declínio da Carreira.


Para entender a história... ISSN 2179-4111. Ano 3, Vol. mai., Série 01/05, 2012, p.01-35.
Este artigo complementa os resultados da pesquisa financiada pela FAPESP e publicada no livro Naufrágios e Obstáculos[i], abordando o tema de forma mais alargada, aprofundando questões deixadas em aberto, através da consulta de fontes primária, pertencente ao Arquivo Histórico Ultramarino e Arquivo Nacional da Torre do Tombo, entre outros arquivos portugueses; possibilitando o entendimento da viragem econômica e social lusitana do Oriente para o Ocidente.
As causas dos naufrágios na Carreira da Índia, a rota que ligava Portugal com as riquezas da Índia, notadamente com as famosas especiarias Orientais; foram variadas, sendo cada perda tributária não apenas de um único fator isolado, mas sim de uma verdadeira somatória de fatores[ii].
Nas mais diferentes décadas do século XVI e XVII, a principal causa dos naufrágios constituiu um agrupamento de fatores envolvendo: a adversidade do tempo; o desconhecimento do território, da profundidade das águas, do regime dos ventos e das correntes marítimas; a imperícia dos pilotos; o excesso de carga e/ou o desgaste natural das embarcações; doenças que dizimaram a tripulação impossibilitando a continuidade da viagem; e ataques de piratas seguidos da queima da embarcação.
Assim, a causa de um naufrágio esteve associada a dois ou mais fatores agrupados, pois, no caso de um naufrágio causado por uma tempestade, por exemplo, este tanto poderia ter sido causado pelo mau tempo em si e pela incapacidade e inexperiência do piloto; ou então devido ao desconhecimento do território e da profundidade das águas.
Reside justamente neste ponto a primeira dificuldade colocada diante da análise das causas dos naufrágios, uma vez que os relatos refletem muito mais o ponto de vista da testemunha do que a real causa da perdição.
Uma segunda dificuldade está no fato da maior parte das perdas não terem deixado testemunhas do ocorrido e/ou terem deixado apenas sobreviventes leigos, portanto, sem gabarito para apontar os fatores ocultos por trás da causa aparente do desastre.
                  

As fontes.
Embora os relatos dando conta de naufrágios em detalhes sejam escassos, refletindo quase sempre apenas descrições calcadas na observação pessoal do narrador, os fatores que levaram ao fundo a maior parte das naus da Índia foram à época, em linhas gerais, largamente conhecidos.
Isto nem tanto devido à compilação da descrição dos sobreviventes e/ou devido à análise dos destroços de embarcações ao alcance, mas sim pelo constante risco a espreitar e conviver com os tripulantes da Carreira da Índia que, por sua vez, geraram protestos comedidos, alertas, e, em determinados períodos, afugentaram os voluntários dispostos a embarcarem, pois eis que eram conhecidos até mesmo entre a arraia miúda.
Para além de cartas breves e relatórios alertando a Coroa sobre os perigos a rondar a rota, doze relatos detalhados de naufrágios, ocorridos no século XVI e XVII, foram compilados e publicados em 1735 e 1736 por Bernardo Gomes de Brito na História Trágico-Marítima[iii].
Brito deu a conhecer a descrição do cotidiano e a maneira como as testemunhas leigas e especialistas tinham observado o desastre em que estiveram envolvidas.
A despeito da importância da compilação destes relatos[iv], a maior parte dos quais teriam se perdido em meio ao terremoto de 1755, não fosse à iniciativa de Brito; uma análise quantitativa dos naufrágios ocorridos na Carreira da Índia entre 1500 e 1700, baseando-se no rastreamento de cada embarcação, através de documentos pertencentes ao Arquivo Nacional da Torre do Tombo e Arquivo Histórico Ultramarino, permitiu extrair várias conclusões acerca das causas dos naufrágios na rota da Índia.


Os naufrágios na Carreira da Índia e algumas conjeturas.
Baseado nas fontes primárias[v], chegamos ao número de navios que circularam na rota no século XVI e XVII[vi], observando que, entre os 205 navios perdidos entre 1500 e 1700, pouco mais da metade, correspondente a 104 naufrágios, tiveram a causa de seu afundamento oficialmente desconhecida, já que estas embarcações não deixaram um único sobrevivente para contar o que teria acontecido.
Ao mesmo tempo, embora qualquer perda não possa ser atribuída a um fator isolado, foram classificados pelos sobreviventes resgatados:
31 naufrágios motivados pelo encalhamento da embarcação; 32 afundamentos em meio ao ataque e pilhagem de piratas;
14 naufrágios em meio a tempestades;
1 como perda de um navio cuja tripulação foi quase dizimada por doenças, obrigando os sobreviventes a abandoná-la, passando a outra embarcação que navegava em sua companhia e colocando fogo a sua própria nau a fim de evitar que caísse nas mãos de piratas;
15 perdas de navios ancorados em portos do Índico devido à má construção e/ou não ter sido realizada uma manutenção preventiva, portanto, neste último caso, ocasionadas pelo desgaste natural da madeira em contato com a água;
8 perdas foram atribuídas ao ataque de nativos, principalmente ao longo do litoral africano.
Enquanto a margem de naufrágios cuja causa é desconhecida foi relativamente pequena na rota do Brasil[vii], não ultrapassando 10%, em exceção de poucos e raros casos isolados; em se tratando da Carreira da Índia, a porcentagem de perdas, em algumas décadas alcançou patamares próximos a 50%.
Examinando os naufrágios na rota da Índia, excluindo os navios que foram a pique em meio a causas desconhecidas, algumas causas principais foram atribuídas pelos sobreviventes.
Dentre estas: 30,69% das embarcações teriam afundado em meio ao seu encalhamento; 31,69% devido ao ataque de piratas; 13,86% durante uma tempestade; 0,99% por doenças que teriam dizimado os tripulantes; 14,85% devido ao desgaste da embarcação e 7,92% durante o ataque de nativos.
O que permitiria conjeturar que, caso conhecêssemos o motivo principal que teria levado ao fundo as naus cuja causa do naufrágio é desconhecida, ficasse evidenciado que mais da metade das perdas teriam sido motivadas pelo encalhamento.
Um claro reflexo da imperícia do piloto e/ou o desconhecimento do território, assim como do assédio de piratas.
Dentro deste contexto, por exemplo, antes da chegada dos holandeses e ingleses ao cenário colonial; no inicio da Carreira da Índia, quando os lusos praticamente não tinham inimigos a sua altura, a maior parte dos naufrágios cuja causa é ignorada teriam sido motivados pelo desconhecimento da profundidade das águas.
Enquanto, depois da União Ibérica, o assédio dos inimigos da Espanha teria sido o principal fator a engrossar o índice de perdas.


-Tabela 1 – Causa principal atribuída aos naufrágios na Carreira da Índia, entre 1500 e 1700, segundo o número de embarcações perdidas.

Período

Desconhecida
Encalhamento
Ataque de Piratas
Desgaste e/ou má construção
1500-1509
10
02
01
00
1510-1519
06
03
00
00
1520-1529
09
03
00
02
1530-1539
05
01
00
00
1540-1549
04
01
00
01
1550-1559
10
01
00
00
1560-1569
02
01
00
01
1570-1579
04
01
00
00
1580-1589
02
03
01
03
1590-1599
13
02
05
03
1600-1609
08
06
12
03
1610-1619
04
03
03
00
1620-1629
08
01
05
02
1630-1639
00
01
04
00
1640-1649
06
02
01
00
1650-1659
03
00
00
00
1660-1669
02
00
00
00
1670-1679
02
00
00
00
1680-1689
03
00
00
00
1690-1700
03
00
00
00

Total

104
31
32
15

Fonte: “Navios da Carreira da Índia (1497-1653), códice anônimo da British Library” e “Governadores da Índia pelo Padre Manuel Xavier” In: ALBUQUERQUE, Luís de (Comentários) & PERICÃO, Maria da Graça (Transcrição). Relações da Carreira da Índia. Lisboa, Alfa, 1989/Documentos pertencentes ao acervo do Arquivo Histórico Ultramarino: Papéis Avulsos da Índia, Caixa 1, 2, 3, 3A, 4, 4A, 5, 5A, 6, 7, 8, 8A, 9, 9A, 10, 10A, 11, 11A, 12, 13, 13A, 14, 14A, 15, 16, 16A, 17, 17A, 18, 18A, 19, 19A, 20, 20A, 21, 21A, 22, 22A, 23, 24, 24A, 25, 25A, 26, 26A, 27, 27A, 28, 28A, 29, 29A, 30, 30A, 31, 31A, 32, 32A, 33, 33A, 34, 34A, 35, 35A, 36, 37, 38, 38A, 39, 40, 41, 42.


-Tabela 2 – Causa principal atribuída aos naufrágios na Carreira da Índia, entre 1500 e 1700, segundo o número de embarcações perdidas.

Período
Tempestade
Doenças
Ataque de nativos
Embarcações avariadas e Não naufragadas
1500-1509
05
01
00
02
1510-1519
00
00
00
03
1520-1529
00
00
01
01
1530-1539
00
00
00
00
1540-1549
00
00
00
00
1550-1559
01
00
01
00
1560-1569
01
00
01
00
1570-1579
00
00
00
00
1580-1589
00
00
00
04
1590-1599
00
00
01
03
1600-1609
01
00
01
05
1610-1619
01
00
01
03
1620-1629
05
00
02
05
1630-1639
00
00
00
00
1640-1649
00
00
00
00
1650-1659
00
00
00
00
1660-1669
00
00
00
00
1670-1679
00
00
00
00
1680-1689
00
00
00
00
1690-1700
00
00
00
00

Total

14
01
08
29

Fonte: “Navios da Carreira da Índia” e “Governadores da Índia”. Op. Cit./Documentos pertencentes ao acervo do Arquivo Histórico Ultramarino: Papéis Avulsos da Índia, Caixa 1, 2, 3, 3A, 4, 4A, 5, 5A, 6, 7, 8, 8A, 9, 9A, 10, 10A, 11, 11A, 12, 13, 13A, 14, 14A, 15, 16, 16A, 17, 17A, 18, 18A, 19, 19A, 20, 20A, 21, 21A, 22, 22A, 23, 24, 24A, 25, 25A, 26, 26A, 27, 27A, 28, 28A, 29, 29A, 30, 30A, 31, 31A, 32, 32A, 33, 33A, 34, 34A, 35, 35A, 36, 37, 38, 38A, 39, 40, 41, 42.


Assim, uma análise quantitativa, década a década, das causas de naufrágios tidas como principais na Carreira da Índia, entre 1500 e 1700, permite chegarmos a uma conclusão mais acertada.
Até pelos menos 1519, quando o mapeamento do Índico estava sendo levado a termo, os 16 naufrágios cuja causa é tida como desconhecidas poderiam ter sido motivados pelo desconhecimento do território, o que, somado aos 5 encalhamentos verificados até então, perfaria um total de 21 perdas ocorridas em meio ao desbravamento do Índico.
O que cobriria 75% dos naufrágios ocorridos nas duas primeiras décadas da Carreira da Índia, ao passo que o dito desconhecimento da profundidade das águas teria sido meramente a causa principal que, agrupada a adversidade do tempo e a outros fatores, teria levado ao fundo 28 embarcações no período.
Igualmente, podemos supor que, entre 1520 e 1589, o grosso dos naufrágios tidos como causados por fatores desconhecidos teriam sido motivados pela imperícia dos pilotos e a má construção ou manutenção das embarcações.
Embora quantitativamente nenhum naufrágio tenha sido atribuído diretamente ao governo deficitário do navio, o cargo de piloto foi extremamente disputado por dar direito a uma participação nos lucros sobre a pimenta, dando direito ainda a fazer carregar certa quantidade do produto em beneficio próprio, razão pela qual muitos nobres compravam o cargo mesmo não entendendo nada da arte de navegar, gerando evidentemente desastres inevitáveis[viii].
No mesmo período, da mesma maneira que se fazia sentir a falta de profissionais gabaritados a bordo dos navios, faltava pessoal capacitado nos estaleiros do Reino, sendo a crescente demanda por novas embarcações satisfeita com navios mal construídos que, muitas vezes, iam a pique já na sua primeira viagem.
Isto acontecia ao mesmo tempo em que os estaleiros dificilmente davam conta de realizar uma manutenção adequada da frota, forçando as naus da Índia a navegarem até literalmente acabar no mar, tal como sugere o baixo índice de embarcações avariadas e não naufragadas reparadas nos estaleiros durante o período - apenas 5 navios ao longo de sete décadas -, demonstrando que só eram efetuados reparos em navios cujas avarias eram por demais significativas.
Seja como for, dentre os 36 naufrágios cuja causa é desconhecida, ocorridos entre 1520 e 1589, podemos conjeturar que a quase totalidade teria sido motivada por uma somatória de fatores envolvendo a imperícia dos pilotos, a superlotação gerada pela mercadoria embarcada pelos tripulantes como parte de seu pagamento, a má construção das embarcações e a ausência de uma manutenção adequada.
Somado os naufrágios atribuídos a cada uma destas causas isoladamente, perfazia um total de 54 perdas decorrentes desta somatória de fatores, equivalente a cerca de 90% dos naufrágios ocorridos no período citado.
Entretanto, durante a vigência da União Ibérica (1580-1640) e, mais especificamente, a partir da década de 1590, o assédio de piratas ingleses e, sobretudo, holandeses, provavelmente, foi à causa principal responsável por quase a totalidade dos naufrágios que tiveram oficialmente causa ignorada.
O que elevaria as perdas decorrentes deste fator de 30 para possivelmente 63 naufrágios, correspondente não menos que 62% dos naufrágios no período, equivalente a pouco mais de 32% dos navios que foram a pique em todo o século XVI e XVII.
Porcentagem que, alias, seria ampliada para 36% caso considerássemos as perdas causadas pelo ataque de nativos ao longo do litoral como atos de pirataria, constituindo este, em termos mais gerais, o principal motivo que, aliado a outros fatores, teria causado afundamentos dentre as armadas da Índia.
Na verdade, o fato de uma embarcação ou frota ser atacada por piratas em si, isoladamente, dificilmente resultaria em naufrágio; contudo, estando às embarcações tripuladas por homens a míngua de víveres, infestadas por doenças e vivenciando um cotidiano à beira do limite[ix]; as condições de defesa se evaporavam.
A crescente gama de problemas que foram se acumulando na rota inviabilizou a sua recuperação, contribuindo concretamente para acentuar o declínio da primazia da pimenta dentro do contexto do ciclo das especiarias e, portanto, acentuando a viragem do eixo econômico e social lusitano do Índico para o Atlântico.
Assim, embora os ataques de piratas tenham quase cessado depois da restauração da monarquia portuguesa em 1640; outros fatores continuaram a existir e se agravaram, de modo que, até o final do século XVII, com exceção de 3 naufrágios, todas as 13 perdas que ocorreram não deixaram sobreviventes, sendo a causa principal destes naufrágios oficialmente desconhecida, porém, com grande probabilidade de serem os desastres tributários da somatória de fatores há pouco mencionada.
Apesar de tomado isoladamente, o ataque de piratas terem sido a causa da maior parte dos naufrágios ocorridos na Carreira da Índia, em termos globais, podemos estimar que a somatória de fatores envolvendo a imperícia dos pilotos associada à má construção e a superlotação foi responsável por 93 perdas.
A somatória de fatores envolvendo estas mesmas causas, mais o ataque de piratas ou nativos teria sido responsável por 75 naufrágios, ao passo que o desconhecimento do território associado à adversidade do tempo teria causado 37 afundamentos.
Além disto, qualquer que fosse o grupo de fatores associados, a inanição e as doenças a bordo contribuíram para agravar o quadro, somando-se aos problemas já enfrentados, ao mesmo tempo em que, em alguns períodos específicos, a ausência de mão de obra qualificada entre os tripulantes também contribuiu para agravar o dito quadro de perdas[x].
Assim, apesar desta estimativa não passar de uma hipótese, levantada a partir dos dados disponíveis e presentes na documentação, podemos supor que, em termos globais, 46% dos naufrágios teriam sido tributários da imperícia dos pilotos associada à má construção das embarcações e a superlotação, 36% das perdas teriam sido causadas pelos mesmos fatores associados ao ataque de piratas ou nativos e 18% dos afundamentos teriam sido motivados pelo desconhecimento do território associado à adversidade do tempo.
Destarte, a complexidade envolvendo a associação de fatores que causaram 205 naufrágios na Carreira da Índia durante o século XVI e XVII, para além de uma mera quantificação destas perdas, exige uma análise de cada um destes fatores em separado. Em suma, é necessário um estudo qualitativo para tentar explicar grande o declínio da rota da Índia a luz dos naufrágios.
Não obstante, antes de adentrarmos a temática, faz-se necessário tentar recompor a localização dos naufrágios, uma vez que isto será essencial à compreensão de fatores a serem discutidos mais adiante.


A localização dos naufrágios.

Embora um grande número de embarcações perdidas tenha sua localização não identificada, aprofundando os dados obtidos com a documentação primária, envolvendo as Caixas da Índia, pertencente ao acervo do Arquivo Histórico Ultramarino de Lisboa; pudemos rastrear a posição geográfica de 135 naufrágios.
Dentro deste contexto: 25 ocorreram próximos a Europa; 15 em regiões próximas à costa Ocidental da África; 55 na região da costa Oriental da África; 10 nos arredores do cabo da Boa Esperança; 24 na costa da Índia e 5 na costa do Brasil.
Portanto, não obstante 35% da localização dos naufrágios sejam ignoradas, dentre as embarcações perdidas cujo local do desastre conhecido: 41% das perdas ocorreram na costa Oriental da África, 18% na costa da Índia, também 18% próximo a Europa, 11% na costa Ocidental do continente africano, 7% no cabo da Boa Esperança e 5% na costa do Brasil.
Considerando igualmente apenas as perdas cuja localização é conhecida, 34% dos naufrágios ocorreram no Atlântico e 66% no Índico.
A primeira vista os números fornecem fortes indícios de que, em termos gerais, o Atlântico mostrou-se mais seguro que o Índico no século XVI e XVII. Não obstante, os dados concretos permitem supor que a longa distância englobando os dois oceanos - Atlântico e Índico -, mais os fatores associados descritos há pouco, tornaram a margem de risco maior na Carreira da Índia.
O que se contrapõem a uma margem de risco menor na rota do Brasil, isto dado, justamente, a menor duração e distância do trajeto, apesar de realmente o Atlântico apresentar, ao menos no percurso entre Lisboa e Salvador e/ou Rio de Janeiro, condições mais tranqüilas de navegabilidade.
A localização dos naufrágios esteve intimamente ligada aos fatores que, somados, causaram a perdição de 205 embarcações na rota da Índia entre 1500 e 1700. O ataque de piratas, por exemplo, esteve restrito a determinadas áreas, enquanto as naus afundadas em meio à superlotação, a imperícia dos pilotos e a má construção circunscreveram-se principalmente ao cabo da Boa Esperança, ao litoral da Índia e a costa Oriental da África.


-Tabela 1 - Localização dos navios naufragados na rota da Índia entre 1500 e 1700:

Período
Ñão Identificado
Próximo a Europa
Costa Ocidental da África
Costa Oriental da África
1500-1509
10
00
05
02
1510-1519
04
00
01
04
1520-1529
04
01
01
08
1530-1539
03
00
01
01
1540-1549
00
01
00
02
1550-1559
02
03
01
06
1560-1569
02
01
00
02
1570-1579
02
00
00
02
1580-1589
02
01
01
02
1590-1599
10
05
00
03
1600-1609
10
05
04
06
1610-1619
00
03
00
03
1620-1629
05
05
00
09
1630-1639
00
00
01
02
1640-1649
04
00
00
03
1650-1659
03
00
00
00
1660-1669
02
00
00
00
1670-1679
02
00
00
00
1680-1689
03
00
00
00
1690-1700
03
00
00
00
Total
71
25
15
55

Fonte: “Navios da Carreira da Índia” e “Governadores da Índia”. Op. Cit./Documentos pertencentes ao acervo do Arquivo Histórico Ultramarino: Papéis Avulsos da Índia, Caixa 1, 2, 3, 3A, 4, 4A, 5, 5A, 6, 7, 8, 8A, 9, 9A, 10, 10A, 11, 11A, 12, 13, 13A, 14, 14A, 15, 16, 16A, 17, 17A, 18, 18A, 19, 19A, 20, 20A, 21, 21A, 22, 22A, 23, 24, 24A, 25, 25A, 26, 26A, 27, 27A, 28, 28A, 29, 29A, 30, 30A, 31, 31A, 32, 32A, 33, 33A, 34, 34A, 35, 35A, 36, 37, 38, 38A, 39, 40, 41, 42.

               
-Tabela 2 - Localização dos navios naufragados na rota da Índia entre 1500 e 1700:

Período
Cabo da Boa Esperança
Costa da Índia
Costa do Brasil
1500-1509
00
02
00
1510-1519
00
00
00
1520-1529
01
00
00
1530-1539
01
00
00
1540-1549
01
01
01
1550-1559
00
01
00
1560-1569
00
01
00
1570-1579
00
00
01
1580-1589
00
03
00
1590-1599
03
02
01
1600-1609
00
05
01
1610-1619
00
06
00
1620-1629
02
01
01
1630-1639
01
01
00
1640-1649
01
01
00
1650-1659
00
00
00
1660-1669
00
00
00
1670-1679
00
00
00
1680-1689
00
00
00
1690-1700
00
00
00
Total
10
24
05

Fonte: “Navios da Carreira da Índia” e “Governadores da Índia”. Op. Cit./Documentos pertencentes ao acervo do Arquivo Histórico Ultramarino: Papéis Avulsos da Índia Caixa 1, 2, 3, 3A, 4, 4A, 5, 5A, 6, 7, 8, 8A, 9, 9A, 10, 10A, 11, 11A, 12, 13, 13A, 14, 14A, 15, 16, 16A, 17, 17A, 18, 18A, 19, 19A, 20, 20A, 21, 21A, 22, 22A, 23, 24, 24A, 25, 25A, 26, 26A, 27, 27A, 28, 28A, 29, 29A, 30, 30A, 31, 31A, 32, 32A, 33, 33A, 34, 34A, 35, 35A, 36, 37, 38, 38A, 39, 40, 41, 42.


Na mesma medida em que grupos associados de fatores estimularam naufrágios circunscritos a determinadas áreas, a incidência de perdas em cada zona esteve vinculada a certos períodos, e estes, por sua vez, aos citados fatores agrupados.
Uma análise calcada em zonas amplas, a cada década, permite notar que, no período inicial da Carreira da Índia, entre 1500 e 1519, quando o desconhecimento da profundidade das águas teve grande peso nas perdas ocorridas por esta altura, à incidência de naufrágios em local ignorado foi grande. Ao mesmo tempo, foram observados também afundamentos na costa Ocidental e Oriental da África e na Índia, ao passo que não foi registrada uma única perda próxima da Europa, onde o mapeamento era mais completo.
A partir de 1520 até a data da União Ibérica, quando a somatória de fatores envolvendo a má construção, a superlotação e a imperícia dos pilotos foram a principal causa dos naufrágios; o número de perdas em local ignorado, comparativamente, foi menor a cada década.
Neste período, as perdas começaram a ser registradas próximas da Europa e da costa do Brasil, tornando também mais freqüente à incidência de naufrágios na costa da Índia, embora o número de desastres navais tenha continuado grande na costa Ocidental e Oriental da África.
Durante a União Ibérica, o assédio inglês e holandês elevou os naufrágios em locais ignorados e próximos da Europa ou da Índia, isto porque muitos ataques não deixavam sobreviventes.
Enquanto os ingleses procuraram concentrar seus ataques no Atlântico norte, os holandeses se voltaram para o Índico.
Depois da restauração da monarquia portuguesa, até o final do século XVII, a despeito da quase a totalidade das perdas oficialmente desconhecidas, os naufrágios foram com freqüência localizados no Índico, isto graças a uma estimativa da última escala efetuada pela nau perdida, demonstrando que, apesar do assédio dos inimigos de Portugal ter cessado, persistiram e se agravaram fatores como a má construção, a superlotação e a imperícia dos pilotos.
Todavia, fosse qual fosse o local do naufrágio ou sua causa principal, a adversidade do tempo, em qualquer período, forneceu forte contribuição a um grande número de desastres, dificultando o transito das naus da Índia entre o Oriente e a Europa.


A adversidade do tempo.
Embora cada naufrágio tenha sido causado por uma somatória de fatores, a adversidade do tempo, responsável por calmarias e tempestades, forneceu forte contributo a um grande número de perdas, agravando a tensão a bordo das naus da Índia.
No caso de uma tempestade, por exemplo, eclodiam conflitos entre os marinheiros mais experientes e os nobres que nada entendiam da arte náutica a servirem como pilotos e/ou capitães; já diante de uma calmaria, retardada a marcha do navio, os víveres começavam a escassear, gerando fome e várias mortes por inanição.
Apesar de apenas 14, dentre os 205 naufrágios ocorridos entre 1500 e 1700, terem sido atribuídos diretamente ao mau tempo pelos sobreviventes, podemos supor que um número superior de perdas foram influenciadas por tempestades.
Até porque, mesmo navegando superlotadas e dirigidas por pilotos incapazes, às embarcações dificilmente iam ao fundo quando o tempo estava em boas condições.
Isto é claro a não ser que a nau fosse parar em um baixo por falta de um mapeamento adequado de certa zona ou cruzasse com piratas.
Prova disto é que existem relatos dando conta que naus mal aparelhadas foram conduzidas, em segurança, por grumetes entendedores da arte náutica na ausência de oficiais vivos ou saudáveis a bordo.
Além disto, a circunscrição dos naufrágios atribuídos ao mau tempo em certas décadas vêm de encontro a esta suposição, uma vez que, ao contrário de causas tal como o ataque de piratas, os fenômenos da natureza não estiveram restritos a períodos definidos por questões políticas e/ou econômicas, estando obviamente fora da previsão e controle humano.
Todavia, certas áreas tinham e ainda tem uma maior propensão às tempestades ou calmarias, no caso, principalmente na ida para a Índia, no Atlântico norte, até que a volta pelo largo fosse iniciada, “[encontrar] (...) ventos contrários”[xi] era corriqueiro, ao passo que, em meio à operação, calmarias eram também freqüentes.
Apanhada por uma destas calmarias, em 1555, a nau Conceição, por exemplo, esteve “quarenta e três dias [sem andar] cousa alguma”[xii].
Em situações extremas como esta, que em certa medida atrapalharam também a vida dos mareantes na rota do Brasil, duas alternativas mostravam-se mais viáveis: arribar a Lisboa, Madeira ou Açores; ou invernar na Terra de Santa Cruz.
Em 1559, por exemplo, a nau Santa Maria da Barca, depois de enfrentar “setenta dias” de clamaria que esgotaram boa parte das reservas de víveres a bordo, foi “invernar no Brasil” antes de ir à Índia, aportando na “Baía de Todos os Santos”, onde “Dom Duarte da Costa, que aí estava por governador, (...) [recebeu com honras] os muitos fidalgos (...) que iam na nau, a quem agasalhou, banqueteou, e deu pousada à sua vontade, [fazendo] o mesmo a toda a mais gente da nau a quem deu mantimentos enquanto ali [estiveram]”[xiii], reparando a nau e abastecendo seus porões com víveres em abundância para o prosseguimento da viagem.
Entretanto, além de, em determinados períodos, a passagem das naus da Índia ter sido proibida por decreto, nem sempre, mesmo em emergências, as embarcações da Carreira da Índia eram bem recebidas nos portos brasileiros. Isto a não ser é claro que homens de posição, que pudessem pagar pela estadia, estivessem presentes a bordo, como foi o caso da nau Santa Maria da Barca.
A passagem de naus da Índia por portos brasileiros, quando notadamente quase sempre Salvador era preferencialmente escolhida como escala, dado o gigantismo das embarcações, exauria os recursos do Estado e dos particulares, que quase sempre nada recebiam em troca da gentileza.
Comprova a afirmação a enorme quantidade de cartas emitidas por autoridades e particulares no Brasil, endereçadas ao Rei, queixando-se de terem socorrido embarcações sob promessa de um reembolso que nunca foi efetivado.
Em certa ocasião o próprio Governador do Brasil, ousadamente, afirmou que se recusaria a reparar e abastecer as naus da Índia necessitadas antes de receber a remuneração pelo serviço, mantendo os braços cruzados até que a Coroa enviasse “à Bahia [o] material para o apresto das embarcações”[xiv].
Devido às múltiplas queixas, diante da situação calamitosa da Carreira da Índia, a Coroa ao mesmo tempo passou a recomendar que os navios só fossem à Terra de Santa Cruz em situação de emergência justificada, tornando a antes gentileza uma obrigação em 1624, promulgando no Regimento dos Armazéns[xv].
Segundo consta no dito regimento, o provedor do estaleiro onde estivesse sendo reparada a nau deveria garantir que fosse dada prioridade, quanto ao uso do material e mão de obra disponível na ocasião, ao reparo da mesma, devendo acompanhar o serviço para garantir que fosse bem feito e executado o mais rápido possível[xvi].
Embora estivesse na gênese desta medida o medo que os tripulantes viessem a desertar antes da nau partir ou que ela perdesse a monção correta, o que motivo o regimento a determinar ainda que fosse dada prioridade ao abastecimento de víveres às naus da Índia em detrimento das embarcações da rota do Brasil[xvii].
Não obstante, em um momento em que a Carreira da Índia estava em contínuo declínio e a rota do Brasil em ascensão, as queixas dos súditos da Coroa, principalmente presentes em Salvador, se tornaram mais freqüentes.
Em 1667, por exemplo, o Governador do Brasil, Alexandre de Sousa Freire, enviou uma carta ao monarca português dando conta que o “concerto das naus da Índia” deixava em “apêrto (...) [tanto os particulares como o] estado”, perguntando de onde “[deveria] sair semelhante despeza”[xviii], pois não havia verba que bastasse para cobrir os gastos.
Após anos de reclamações e má vontade no lidar com as embarcações da Carreira da Índia que fizeram escala nos portos brasileiros, diante da insignificância que os produtos importados do Oriente assumiram frente às mercadorias transportadas pela Carreira do Brasil, em 1674, a Coroa acrescentou uma emenda ao Regimento dos Armazéns obrigando as naus da Índia que invernassem no Brasil “a dar fiança de dez mil cruzados”[xix] como garantia que iriam saldar a divida contraída por conta de víveres ou reparos.
Tudo indica que as dívidas continuaram a não ser saldadas, mostrando-se a fiança, na maioria dos casos, insuficiente se quer para cobrir os custos, uma vez que as queixas continuaram, como comprovado pelo pedido do Governador do Brasil, D. João de Lencastre, de “sobressalentes para acudir as naus da India que [chegassem] à Bahia”[xx].
Na ocasião, ele justificava que a mão de obra e a matéria prima disponível estava comprometida com o reparo e a equipagem das embarcações da rota do Brasil, não podendo o estaleiro de Salvador desviar qualquer recurso para dar prioridade às armadas da Índia.
Exatamente pelas queixas múltiplas que gerava ir invernar no Brasil, isto a partir da segunda metade do século XVI, quando o açúcar produzido em Pernambuco instalou praticamente uma Carreira mantida por particulares entre Lisboa e a Terra de Santa Cruz, além é claro do descaso com que muitos navios eram tratados em alguns portos do Brasil, muitos capitães de naus da Carreira da Índia, diante de calmarias na saída de Lisboa ou do Oriente, optavam por fazer o caminho inverso, arribar. 
Dentre os 1135 navios que, de 1497 até 1700, fizeram o percurso entre o Reino e o Oriente, 81 optaram por arribar a Lisboa, grande parte dos quais recuaram diante de calmarias que impossibilitaram o inicio da volta pelo largo em uma monção adequada para cruzar o cabo da Boa Esperança.
Estes capitães preferiram adiar a viagem para o próximo ano ao invés de ir invernar no Brasil até que o regime de ventos se fizesse adequado, pois, além das deserções, temia-se uma acolhida nada calorosa nos portos brasileiros.
Muitas outras embarcações, embora não possamos precisar exatamente quantas, pela mesma razão optaram por arribar à Madeira ou aos Açores, locais mais rápido e facilmente alcançáveis e onde os negócios eram feitos com maior lisura.
No Brasil, exatamente porque equipar as naus da Índia significava exaurir os recursos disponíveis, a escassez de oferta gerava um aumento nos preços, propiciando aos poderosos superfaturar víveres e matéria prima, embora muitos não chegassem a receber nada no final das contas.
Esta conjetura é comprovada pela devassa que mandou fazer o “provedor da fazenda[,] João do Couto de Andrade[,] sôbre os descaminhos que [existiram no reparo de uma] nau da India [em] São Pedro da Ribeira”[xxi], na Bahia, em 1683.
Além disto, diante do calote da Coroa ou dos armadores responsáveis por parte da equipagem do navio, em casos extremos os particulares que tinham títulos em mãos não saldados chegavam a incentivar saques da carga das naus da Índia estacionadas em estaleiros brasileiros.
O ato era legalizado por autoridades lusitanas presentes no Brasil, em geral também portadoras de títulos não saldados, através de pretextos que justificariam a tomada da carga, tal como o fato da nau estar tão avariada que não poderia ser reparada, fazendo-se necessário descarregá-la a fim de evitar a perda das mercadorias.
Sendo de origem Oriental ou vindos do Reino, os produtos saqueados das naus da Índia tinham um alto valor no Brasil.
Uma vez descarregada a nau, o cabedal era tomado em pagamento de dividas contraídas, como ocorreu, por exemplo, em 1663, com uma naveta da Índia[xxii] e, em 1699, com embarcações mais robustas[xxiii].
Em outros casos, não havendo cabedal a ser tomado, principalmente depois que a rota do Brasil adquiriu uma importância econômica e social maior, embora já estivessem os estaleiros brasileiros obrigados a dar prioridade à equipagem das naus da Índia, pretextos eram inventados para deixar o reparo e fornecimento de víveres destas embarcações em segundo plano.
Em 1649, por exemplo, uma nau “da India [que tinha] arribado à Bahia” estava estacionada “há três anos”[xxiv] em Salvador sem que fosse reparada ou abastecida.
Este descaso gerava constantemente desentendimentos entre os oficiais mais graduados das naus da Índia e autoridades lusitanas na Terra de Santa Cruz, contudo, os últimos quase sempre acabavam ganhando a contenta, uma vez que, tendo concentrado em suas mãos o poder sobre os meios disponíveis, manipulavam as informações que chegavam ao Reino.
Foi o que aconteceu quando um conflito instalou-se entre o “vice-rei da India, Antônio de Melo e Castro”, cuja embarcação havia sido obrigada a arribar em Salvador, e “administradores da Companhia do Comércio [do Brasil]” em 1687, quando os últimos simplesmente evitaram que o rei  de Portugal ficasse sabendo o que estava ocorrendo, através da recusa do fornecimento ao vice-rei da Índia de uma “embarcação para trazer (...) aviso ao reino”[xxv] do que estava se passando na Bahia.
No entanto, as clamarias não deixam muitas opções em aberto, pois, para além de arribar ou ir ao Brasil, prosseguir a viagem rumo à Índia caracterizava um grande erro pelo qual tripulantes e passageiros pagavam um alto preço.
Em 1553, por exemplo, a adversidade do tempo tornou os víveres a bordo da nau São Bento escassos, ao passo que “tomando conselho [o capitão] sobre o que [deveria fazer]”, foi sugerido que “arribasse”, o qual, temendo “perder a viagem de todo” e “ser a monção passada”[xxvi], insistiu na continuidade da viagem, causando grande mortandade a bordo, quando inclusive o “piloto faleceu”[xxvii], vindo depois à nau a naufragar pela altura do cabo da Boa Esperança.
Destarte, se na ida, diante de uma calmaria, arribar ou ir invernar no Brasil era a opção mais sensata, sendo nesta ocasião a dita calmaria uma constante, na volta para Portugal era freqüente topar com grandes tempestades no Índico ou no Atlântico sul, principalmente nas zonas com maior incidência de mau tempo: o cabo da Boa Esperança e a chamada Terra do Natal.
No dito cabo, na melhor das expectativas, eram sempre encontrados fortes “ventos contrários” que forçavam as embarcações à “[arriar] todas as velas” para evitar perder os mastros, ao mesmo tempo em que “as ondas do mar (...) desabavam (...) como se fossem montanhas”, obrigando os navios a deixarem-se “correr para trás com vento o menos possível”, visando evitar “a violência do mar”[xxviii] que podia, caso contrário, despedaçar qualquer nau, sendo que, diante da superlotação e mau estado de conservação, os navios lusitanos mostravam-se ainda mais propícios a ir a pique.
Em tais condições, muitas naus da Índia naufragaram no cabo da Boa Esperança, sendo sempre avistado em seu litoral “pedaços [destas naus] (...) devorados pelo mar, com gente e tudo [e] (...) muitas caixas, barris, escotilhas, pedaços de mastro e [restos] de pessoas mortas, atadas a tábuas, e outros sinais pavorosos semelhantes”[xxix].
Passar o cabo era, por este motivo, sempre muito comemorado, estando a cargo da competência do piloto adotar estratagemas que amenizassem os riscos, na nau em que esteve embarcado o holandês Jan Huygen van Linschoten, por exemplo, “por não haver perigo de corsários, [optou-se por conservar] toda a artilharia no fundo do navio”, conferindo maior estabilidade a embarcação “para assim passar melhor as tormentas do cabo da Boa Esperança”[xxx].
Passado o cabo, pela altura de “28 graus e dois terços”, a cerca de “mais de 400 léguas da costa [africana] pelo mar aberto”, passavam as naus da Índia pela Terra do Natal, que era “muitas vezes mais [temida] (...) do que o próprio cabo”, pois ali dificilmente deixava-se de encontrar “muitas tempestades e trovoadas, (...) sendo [lá] muitos navios destruídos e devorados”[xxxi].
Quando uma embarcação não sofria avarias no cabo da Boa Esperança, sempre acabava avariada na Terra do Natal, algumas vezes podia ser reparada em alto mar pelos carpinteiros e calafates embarcados, mas em outras ocasiões era necessário aportar, sendo dada prioridade à busca de abrigo em Santa Helena.
No entanto, nem sempre a ilha podia ser encontrada, simultaneamente, avarias de maior gravidade exigiam reparos em estaleiros devidamente equipados, obrigando as naus a buscarem auxilio invariavelmente no Brasil.
Dentro deste contexto, assim como na ida deixar de arribar ou invernar constituía um grave erro, na volta furtar-se de fazer escala em Santa Helena ou buscar reparo no Brasil, principalmente depois de uma tempestade, aumentava muito o risco de naufrágio.
Por este motivo, sendo amplamente conhecidos os problemas envolvendo a escala em Salvador, muitos capitães optavam por não só tentar encontrar Santa Helena como também, em qualquer caso, ir ao Brasil, buscando inclusive arranjar algum pretexto, mesmo não possuindo avaria alguma na nau que comandavam, para aportar na Bahia a fim de negociarem produtos Orientais no mercado negro, se apropriando dos lucros.
Assim procedeu “o capitão Antônio Cabral”, comandante do “galeão São João”, em 1649, sob pretexto de ter sofrido “grande tempestade no cabo da Boa Esperança”[xxxii], a despeito de aparentemente a embarcação ter sofrido na ocasião avarias que poderiam ter sido facilmente reparadas em alto mar.
Pretextos à parte, tempestades podiam ser enfrentadas em qualquer época do ano ou zona, causando grandes transtornos a bordo, exigindo “mui grande trabalho (...) e [propiciando] nenhum repouso”[xxxiii] aos tripulantes.
O mínimo que uma tempestade provocava era “[corromper] os corpos”, causando enfermidades do estômago e agravando o quadro de doenças a bordo; em 1560, por exemplo, na nau São Paulo, “depois [das] chuvas (...) e tormentas, (...) de quinhentas e tantas pessoas (...) que na nau iam, não ficaram senão quinze (...) que não [passaram] esta fúria de enfermidades”, deixando o balanço da embarcação, durante a tempestade, inclusive “os homens do mar, cursados e antiquíssimos”[xxxiv], em estado tão lastimável que impediu o navegar constante da embarcação, sendo o mal combatido com “sangrias”[xxxv] que não fizeram mais que agravar os problemas a bordo.
Enfrentar uma tempestade podia trazer conseqüências mais graves.
Em 1552, o galeão Grande São João, sofrendo já com a podridão da madeira, que deveria ter sido substituída caso houvesse uma manutenção adequada da embarcação, e com “grande peso”[xxxvi], “perdeu (...) o leme” em meio a uma tormenta.
Na ocasião “o vento (...) [era tão] bravo [que] lhe levou o papa-figo da vela grande”, deixando o navio “sem vela”, completando o quadro de sua perdição “três grandes mares, que do balanço que a nau deu[,] lhe arrebentaram os aparelhos e costeiros de bombordo”[xxxvii], levando o galeão ao fundo em decorrência destas avarias, depois alguns percalços.
Já no caso da nau São Alberto, em 1593, foram os próprios tripulantes que se encarregaram de “cortar (...) os mastros” em uma tentativa de conter a marcha do navio durante uma tempestade que fazia “ondas (...) com grande fúria [rebentar] na nau”, tormenta esta que arrastou muitos homens ao mar “com pernas e braços quebrados”[xxxviii].
Em outras ocasiões, quando as tempestades não causavam avarias no aparelho ou no casco da nau, podiam, como no caso das calmarias, esgotar os víveres a bordo, a nau Chagas, por exemplo, navegando de volta ao Reino superlotada, perdeu quase todos os mantimentos que trazia quando enfrentou uma “grande tormenta” pela altura do “cabo de Boa Esperança”, pois trazia os víveres alojados “por cima” do tombadilho, uma vez que os porões estavam totalmente ocupados com pimenta, caindo os mantimentos ao mar em meio a “muita água [que penetrava] pelo cisbordo”, o que foi responsável pela “míngua”[xxxix] que depois se fez presente.
Visando contornar problemas como este, as embarcações da Carreira da Índia partiam geralmente em grupos, procedimento adotado para evitar o ataque de piratas e facilitar o socorro mútuo.
Mas, diante de uma tempestade, os navios da armada eram obrigados a se separar, pois, caso contrário, quando se mantinham próximos, literalmente, acabavam sendo danificados por trombar um com o outro.
O aconteceu com a nau comandada por “Pedro Afonso de Aguiar” que, “com uma tormenta, recebeu algum dano, por abalroar com a nau de Afonso Lopes da Costa”[xl].
Assim, enfrentando mal tempo, adotava-se a manobra evasiva de afastamento, o que isolava e entregava cada navio a sua própria sorte, momento no qual, justamente, costumavam ocorrer desastres que não deixavam sobreviventes ou testemunhas.
De qualquer modo, mesmo quando não causavam dano algum, as tempestades contribuíam para o desgaste natural da embarcação que, na ausência de uma política de manutenção preventiva, pouco a pouco se tornava menos resistente aos embates do mar.
Além disto, via de regra, muitas vidas eram perdidas em meio às tempestades, diversos tripulantes eram arrastados pela força do mar, como foi o caso do fidalgo D. Estevão Álvares, capitão da nau “S. Salvador”, que, em 1583, “vindo para o Reino no cabo da Boa Esperança lhe levou um mar a varanda com um seu sobrinho”[xli].
A adversidade do tempo podia ainda, em casos mais raros, trazer problemas de ordem mais complexa que tempestades ou calmarias.
Em 1554, por exemplo, a nau São Bento, padecendo já de outras dificuldades, foi atingida “pela banda do estibordo” por “uma onda (...)[,] que de muito longe vinha levantada por cima das outras em demasiada altura”[xlii][,] decorrente de um maremoto, não naufragando por puro milagre.
Não obstante aos desastres e mortes cuja causa principal foi atribuída pelos sobreviventes às intempéries da natureza, dificilmente a adversidade do tempo em si era capaz de levar isoladamente a pique um navio.
Para que uma embarcação do porte das naus da Índia naufragasse era necessário que outros fatores se aglutinassem.


O contrabando e a superlotação.
Muitas vezes os pilotos tinham o exercício de seu ofício literalmente dificultado pelo cabedal excessivamente embarcado, pois “o mestre e os oficiais não [tinham] qualquer palavra a dizer” quanto à lotação máxima comportada “a não ser à última hora, quando o navio [fazia] à vela” e nada mais restava a fazer, ficando as embarcações “[repletas de mercadorias] por todos os lados, até a coberta superior ou convés, onde ficavam normalmente sete ou oito caixas, umas em cima das outras, da proa até à popa”[xliii].
Nestas circunstancias, “o castelo de proa, o tombadilho (...) onde o piloto [tinha] a sua cadeira, [ficava] repleto (...) [com] grandes jarras, barris, caixas e galinheiros, (...) [constituindo um verdadeiro] labirinto”[xliv] a envolver o piloto e a impedir sua visão e o correto exercício de sua função a bordo.
Na verdade, conforme os portugueses foram fincando os pés no Oriente, crescendo a oferta de especiarias e outros produtos a serem embarcados para o Reino, na mesma medida em que os estaleiros não conseguiram dar conta da crescente demanda por novas embarcações, optou-se por aumentar o porte das naus, superlotando-as.
O crescimento da tonelagem transportada fez-se sentir já na terceira década depois da abertura da rota da Índia. Enquanto em 1505 a nau Leitoa Velha, por exemplo, trouxe “2.053 quintais”[xlv] de especiarias, “em 1526 (...) uma só das naus chegadas a Lisboa [transportou] 6.924 quintais”, um aumento de mais de 300%.
O crescimento do cabedal transportado não parou por aí, pois, em 1547, as naus passaram a carregar em média entre “7.392 quintais e (...) 8.910”, sendo o transporte de carga aumentado em 1551 para pelo menos “12.000 quintais”[xlvi].
Assim, levando em conta que cada quintal correspondia a 58,328 Kg, a média transportada por nau, em 1505, teria sido equivalente a 119 toneladas (segundo a acepção atual da palavra), sendo que, em 1526, teria esta média sido elevada a 403 toneladas, passando a 519 toneladas em 1547 e 700 toneladas em 1551, um aumento total de quase 600% em pouco menos de meio século.
Conforme o crescimento forçado do porte das naus foi aumentando, o navegar das embarcações foi se tornando mais mal compassado, devido ao gigantismo das naus, forçando a Coroa a expedir uma ordem, datada em 22 de setembro de 1623, para que os mestres da Ribeira das Naus emitissem um parecer sobre a conveniência do tamanho dos navios.
Segundo este parecer, assinado em 29 de setembro de 1623, “Balthazar Gonçalvez, Pedro Medela e Bartholomeu Alvares, carpinteiros, e Antonio Dias, mestre de calafetes[,] e Antonio Luis[,] calafate, foram do mesmo voto do mestre acima dito, e Gaspar Alvares patrão mór foi do mesmo voto com declaração que se [havia] de ter particular cuidado de não sobrecarregarem as ditas naus porque nas medidas referidas não [eram] capazes de muita carga e d’este mesmo voto foi Pedro Fernandes mestre da carreira da India”[xlvii].
Desta forma, apesar do crescimento do porte das naus da Índia ter garantido uma maior capacidade de transporte, tornou a tolerância ao excesso de carga quase nulo.
Embora oficialmente, até o inicio do século XVII, o porte das embarcações tenha permanecido adequado à quantidade de especiarias transportadas, freqüentemente os tripulantes contrabandeavam produtos de alto valor na Europa, com a conivência das autoridades locais e do Reino, embarcando uma tonelagem muito superior à capacidade comportada.
Oficialmente, segundo uma lei promulgada em 1516, além dos soldos pagos pela Coroa, cada tripulante tinha o direito de transportar uma certa quantidade de produtos conforme o cargo ocupado como parte de seu pagamento, cada “grumete” podia carregar “2” quintais de especiarias, enquanto os “marinheiros” e “soldados” tinham direito ao transporte de “3 quintais” e os “oficiais” de “4” quintais, isto a despeito de, para além deste direito, o capitão, o mestre, o piloto, os secretários e os artilheiros poderem ainda transportar “uma caixa (...) [em sua] câmara ou camarote segundo a [sua] categoria (...) e [disporem] de parte da câmera comum”[xlviii].
Os capitães tinham direito a um transporte adicional de “180 quintais”, os pilotos podiam levar “80” quintais, os mestres e os demais oficiais “um pouco menos” e os artilheiros “2 quintais e 2 onças”[xlix]. Além disto, os oficiais eram os únicos que tinham o direito de “levar consigo até a Índia o dinheiro das quintaladas a que tinham direito”[l], livre de imposto, sendo raramente respeitada esta limitação, possuindo também um espaço reservado no “porão (...) de 20 pipas”[li] cada um para fazer transportar o que bem entendessem.
Sendo notoriamente conhecido o volume de contrabando importado da Índia por tripulantes, a Coroa procurou combater a fuga do fisco através da proibição dos “empréstimos a risco aos marinheiros ou gentes da tripulação sobre suas soldadas, proibindo, também, os empréstimos a risco que tivesse por objeto, ou só o frete a vender, ou só lucro esperado de fazendas”[lii].
Entretanto, o contrabando beneficiava um número tão grande de funcionários dos escalões mais elevados, que todas as medidas neste sentido nunca foram observadas ou cumpridas.
Ao contrário do que pretendia a Coroa, podemos supor que a tonelagem de especiarias contrabandeadas tendeu somente a aumentar, superlotando as já pesadamente carregadas naus da Índia, criando uma situação insustentável, onde “a maior parte das naus [largava] de Cochim” ou de Goa “sobrecarregadas e mal providas de víveres, além de levarem pouca ordem e disciplina entre a tripulação” e, “apenas por milagre divino[,] uma delas [conseguia] chegar a Portugal sã e salva”[liii].
Graças à ganância de alguns mercadores e dos tripulantes, mesmo quando a Coroa evitava sobrecarregar as naus, dificilmente uma embarcação deixava de sair da Índia com excesso de cabedal, tal como ocorreu com o galeão Grande São João. Partindo em 1552 do Oriente, com apenas onze mil quintais, tendo capacidade para “levar doze mil”, isto por “haver pouca pimenta onde carregou”, mas que “nem por isso deixou de ir muito carregado de outras mercadorias”[liv], a maior parte contrabando, naufragando justamente “pelo grande peso da nau” associado à embarcação ser “tão velha”[lv] que era só uma questão de tempo para ir ao fundo em meio a uma tempestade.
A ganância de alguns foi tamanha que mesmo em momentos de desespero não pôde ser deixada de lado. Quando a nau Santa Maria da Barca estava prestes a ir a pique, em 1559, em um momento em que os esforços de todos eram requeridos para evitar o desastre, “havia homens, que em vez de ajudarem, se punham a fazer requerimentos ao capitão, e ao mestre, que não bulissem com a [sua] fazenda”, a qual tripulantes mais sensatos tencionavam “alijar (...) ao mar”[lvi] para aliviar o peso, em uma tentativa de evitar o naufrágio, sendo registrado até mesmo ameaças de morte ao guardião que coordenou os esforços.
Em uma tentativa infrutífera de tentar ao menos amenizar a superlotação, a Coroa passou a obrigar “ao mestre e aos outros oficiais [a jurarem] que a nau [estava] suficientemente forte e capaz para efetuar a longa viagem” antes de partir, sendo “lavrado um auto, que [era] assinado pelos oficiais da nau”, mas “na altura devida eles [calavam-se], mesmo se a nau [tivesse] mil falhas e defeitos, para não perderem os seus cargos e os proveitos respectivos, mesmo se [soubessem] muito bem que a nau não [estava] em condições de fazer a viagem, porque a cobiça [enganava] a sabedoria e [menosprezava] os perigos”, vindo a se arrepender “apenas quando [estavam] a meio do caminho”, quando então tudo que restava era fazer “grandes promessas de se emendarem”[lvii] caso escapassem do destino pelo qual haviam sido eles próprios em grande parte responsáveis.
Apesar do juramento e do auto lavrado, não existe registro de uma única punição a qualquer oficial que tenha afirmado que a nau que tripulava não estava com excesso de carga, na realidade só existem registros de punições a oficiais da Carreira da Índia envolvidos com atos considerados como traição, tal como a não resistência durante ataque inimigo.
Nenhuma medida adotada pela Coroa pôde impedir que as naus da Índia deixassem de partir com “o convés empachado com pipas e caixas”[lviii]. Qualquer embarcação partia da Índia “toda coberta de mercadorias, e tão carregada que os ovéns [ficavam] debaixo de água, estando a coberta superior ou convés sempre cheia de caixas, sete ou oito umas em cima das outras, que não [tinham] lugar em baixo, por lá [ficar] tudo estivado de tal maneira que não [havia] um cantinho onde pegar para que não [estivesse] cheio”, dificultando o “governar [da] nau”[lix].
Enquanto o cabedal dos tripulantes ou de mercadores ocupava as cobertas superiores destinadas ao transporte de víveres e passageiros, a “carga de pimenta (...), tanto da parte de el-rei como parte dos rendeiros, (...) [era] armazenada por baixo das duas cobertas inferiores”[lx], de modo que “não [havia] espaço que não [fosse] preenchido (...) [em] próprio proveito”[lxi].
Algumas naus chegavam a ficar de tal modo superlotadas que passavam a navegar com muita dificuldade e só não iam ao fundo por pura sorte, a nau São Francisco, por exemplo, em 1596, época na qual o excesso de carga havia se tornado absurdo, “saiu (...) tão carregada de uma banda, e tão pouco da outra, que juntando esta com outras desordens, se foi fazendo cada dia tão boiante de uma, que [chegou] a tempo em que o costado, com pouco encarecimento, [serviu] de quilha, e a quilha de costado”[lxii], tamanha a inclinação da embarcação.
Este excesso de carga não só contribuiu para engrossar o índice de perdas como também foi responsável por dificultar o cotidiano dos embarcados, restringindo ainda mais o espaço disponível a bordo.
A enorme quantidade de caixas no convés causava constantemente acidentes que, em alguns casos, chegaram a tirar a vida de alguns passageiros ou tripulantes.
Em 1554, por exemplo, uma onda que quase virou a nau São Bento “deitou ao mar muitas caixas” e estas por sua vez carregaram “juntamente o carpinteiro (...) e outras pessoas”, ferindo-se muitas outras pessoas “com os caixões que correram à banda ao contramestre e calafates”[lxiii].
A contribuição do contrabando e, portanto, da superlotação, aos naufrágios na Carreira da Índia se tornou tão grande durante a União Ibérica que passou a interferir também na defesa das naus quando atacadas por piratas, forçando a Coroa a encomendar uma análise de seu peso na perdição dos navios assediados por inimigos ao Almirante português João Pereira Corte Real.
O almirante recomendou, em “1o. de Janeiro de 1622”, que o rei não concedesse mais aos tripulantes “os favores nem as liberdades das caixas nem outro algum lograr para carregar”, sendo que, ao seu ver, o único modo de combater o excesso de carga era acirrar o controle sobre tudo e todos que fossem embarcados, “assim á ida como á vinda”, e tornar o Estado o “absoluto senhor de toda a carga da nau e de todo lograr que [houvesse] de carregar”, não devendo ser concedido privilégio algum nem mesmo ao “capitão”[lxiv].
Não obstante a recomendação, nenhuma medida foi adotada no sentido de restringir o cabedal.
Além disto, mesmo se a superlotação tivesse de algum modo sido sanada, pouco efeito teria exercido sobre o índice de perdas, uma vez que a raiz do problema era mais profunda, pois a falta de uma manutenção coerente das embarcações e de uma renovação periódica da frota contribuiu em grande medida em quase todos os naufrágios observados depois de 1520.


O desgaste das embarcações.
Assim como os estaleiros não conseguiram dar conta de atender a crescente demanda por novos navios, a falta de profissionais qualificados e de algumas matérias primas, além é claro da sempre precária situação financeira da Coroa, impediu que as naus da Índia fossem periodicamente reparadas e substituídas quando necessário por novas embarcações, resultando em inúmeros naufrágios.
No inicio as embarcações da Carreira da Índia, construídas em Portugal, usavam, sobretudo, madeira de sobro nas partes que ficavam em contato mais freqüente com a água, pois esta qualidade de árvore fornecia a matéria prima mais resistente ao inevitável apodrecimento.
Não obstante, ao longo do século XVI, este tipo de madeira começou a tornar-se rara, passando a ser utilizado com mais intensidade o carvalho e o pinheiro, árvores antes usadas em partes das naus que não tinham contato direto com a água do mar, ao passo que mesmo esta qualidade de madeira começou também a escassear, obrigando os mestres carpinteiros a fazerem uso de árvores ainda verdes e muitas vezes cortadas fora da época e lua mais indicada.
Na Índia, os estaleiros passaram a usar a teca, qualidade de madeira até certo ponto mais resistente que a madeira européia, mas que estava igualmente sujeita ao apodrecimento quando em contato com a água salgada, resultando na construção de embarcações com vida útil mais curta.
Além disto, tanto em Portugal como na Índia, a falta de profissionais qualificados foi responsável por muitos navios mal construídos ou impermeabilizados, ao passo que a falta de matéria e mão de obra serviu de pretexto a um superfaturamento absurdo coordenado por altos funcionários da própria Coroa em proveito pessoal, encarecendo o custo da construção de novas embarcações e o reparo das já existentes.
A nau São Tomé, por exemplo, naufragou “na terra dos fumos no ano de 1589”[lxv], nascendo os problemas enfrentados por ela “do calafeto, por cuja causa se perderam muitas naus”, e do excesso de “fazendas” que “se [meteram na] nau”[lxvi], de modo que logo no inicio da viagem, “indo demandar a Ilha de Diogo Rodrigues, que [estava] a vinte graus do Sul”, deu-lhe “o vento sueste tão rijo, que logo alevantou os mares de feição que indo correndo a nau à vontade do vento, com o trapear que fez, abriu por proa pela botecadura, por onde fora a estopa do calafeto, [começando] a fazer alguma água, ao que logo acudiram e remediaram muito bem”[lxvii] os carpinteiros embarcados, não obstante, mais tarde, por ter sido má construída, “acudindo os oficiais”, foi encontrada mais “água, que era muito grossa”[lxviii], ao que, após muito lutarem todos a bordo contra a água por meio das bombas, terminou a embarcação por “encalhar”[lxix].
Exatamente devido a este fatores, enquanto as naus construídas no inicio do século XVI tinham capacidade para durar décadas, aquelas confeccionadas posteriormente duravam cada vez menos.
A nau Conceição, por exemplo, que entrou em serviço em 1503, durou 24 anos, somente sendo aposentada quando naufragou em 1527, justamente por nunca ter sido reparada ou substituída.
A nau Conceição serviu sob o comando de Duarte Pacheco Pereira, o famoso, que a utilizou durante alguns anos no combate ao Samorim, do qual saiu vitorioso, sendo com ela responsável pela construção da fortaleza de Cochim[lxx] e pelo assentamento de uma feitoria em Coulão[lxxi].
Após anos de serviço no Oriente, quando voltou ao Reino, foi integrada a armada de 1512, passando a ser comandada por Gonçalo Pereira de Miranda[lxxii], permanecendo mais alguns anos servindo no Oriente, fazendo, depois, parte da armada de 1520[lxxiii] e de 1521[lxxiv].
A Conceição permaneceu então novamente por algum tempo no Oriente e foi integrada a armada de 1527, quando então já muito desgastada pelo tempo perdeu-se “na ilha de São Lourenço com toda gente”[lxxv].
Já a nau Graça, que entrou em operação em 1533[lxxvi], durou apenas 9 anos, naufragando em 1544, em meio a causas desconhecidas, em Moçambique, e a nau São Felipe durou ainda menos, 4 anos, tendo sido lançada ao mar em 1596[lxxvii] e ido a pique ao sair de Lisboa em 1600[lxxviii].
No século XVII, tornou-se freqüente o registro de naufrágios no mesmo ano em que a embarcação havia acabado de sair do estaleiro, como no caso do galeão São João Evangelista, que foi ao fundo em 1608[lxxix], isto antes mesmo de conseguir chegar à Índia.
Tornou-se igualmente corriqueiro o registro de navios que foram ao fundo sem terem qualquer causa externa aparente, quando então se encontravam ancorados em locais considerados seguros sob bom tempo, como ocorreu com a urca Nossa Senhora do Pópulo que, construída em Goa, perdeu-se junto a sua barra em 1519, sendo possível na ocasião, dado as condições favoráveis do tempo e sua proximidade da terra, salvar toda gente e mercadoria que ia embarcada[lxxx].
Na verdade, o ideal seria que houvesse uma renovação contínua da frota, isto conforme as condições em que cada navio havia sido construído e o desgaste sofrido pelo mesmo, mas isto não aconteceu.  
A falta de recursos da Coroa, somada a fuga dos investidores e a própria falta de matéria prima e mão de obra nos estaleiros do Reino e do Oriente, não deixou outra alternativa ao Estado senão utilizar os navios disponíveis até que literalmente acabassem no oceano.
Não importava o quanto estivessem desgastados pela ação do tempo e do mar, os navios eram usados até o seu fim, sendo raras vezes reparados e quando muito equipados com uma nova tripulação e um novo capitão antes de serem reutilizados e integrados a uma nova armada.
A estratégia até teria obtido um bom efeito se tivesse sido respeitado à vida útil das embarcações ou se elas tivessem sido reparadas com maior freqüência, mas nunca foi observada qualquer medida preventiva neste sentido, a Coroa deixou a manutenção das naus a cargo dos armadores que participavam da equipagem dos navios.
Estes, por sua vez, tendo direito a uma participação nos lucros gerados pelo navio que haviam ajudado a equipar apenas durante um número limitado de viagens, não efetuavam reparos a não ser que os danos fossem significativos.
Vencido o contrato, findava-se qualquer direito à participação nos lucros e, igualmente, a obrigação de ajudar a equipar a nau, ficando a sua manutenção totalmente entregue a Coroa.
O Estado, endividado, captava novos empréstimos a risco sob pretexto de servirem ao reparo e equipagem dos navios, usando este capital para financiar a manutenção do pesado aparelho estatal e para a compra de produtos Orientais na fonte, deixando a necessária manutenção dos navios ao relento.
Dentro deste contexto, a contribuição do desgaste das embarcações, assim como a falta de uma renovação coerente da frota, fez-se sentir enormemente devido ao gigantismo e descompasso das naus cada vez mais superlotadas e dirigidas por pilotos incapazes e inexperientes.
Tornaram-se constantes as queixas sobre o estado das naus da Índia e os naufrágios atribuídos principalmente à podridão da madeira, mas nada foi feito para sanar este mal.
Em 1642, por exemplo, Carlos Roque da Silveira escreveu ao rei alertando para estado de podridão das naus da Índia que iriam dentro de alguns meses partir para o Oriente, aconselhando D. João IV a providenciar a verba necessária para o reparo[lxxxi].
A Coroa não deu a menor importância ao alerta e nem sequer se deu ao trabalho de responder ao remetente, até porque a sua atenção estava então totalmente voltada para a nascente Carreira do Brasil.
A Coroa portuguesa só foi dar atenção ao problema no século XVIII, isto depois de ter entregado a exploração da Carreira da Índia a iniciativa privada, quando procurou incentivar uma renovação constante da frota mercante, tentando forçar “os negociantes a adquirirem bons navios”, principalmente, através da cobrança de uma taxa de “20%” sobre a compra dos “barcos (...) a venda no porto de Lisboa” com “mais de cinco anos”, cobrando apenas “10%” de taxa sobre a compra de embarcações que tivessem “de um a cinco anos”[lxxxii].
Destarte, em se tratando do século XVI e XVII, quando uma embarcação se encontrava desgastada, não havia bom piloto que a pudesse salvar, sendo apenas uma questão de tempo para que fosse a pique.
Neste tipo de situação, somente a sorte podia intervir em favor dos navegantes, tal como foi o caso vivido pela nau Patifa, em 1559, “em que ia o Governador Francisco Barreto”, que, enfrentando “muitos ventos contrários” e “grandes balanços”, devido “a velhice e podridão da nau”, começou a fazer “água”, obrigando os tripulantes a “[acudirem] as bombas” para “lançar fora a água que entrava nela por muitas partes que estavam abertas”[lxxxiii].
Em meio ao desespero do momento, o governador “Francisco Barreto” terminou optando por ordenar ao capitão que arribasse a Moçambique, isto graças a um “conselho” do piloto que, “como pessoa principal”, havia afirmado:

“Que ele havia cinqüenta anos que andava no mar, e tinha passado aquela carreira muitas vezes, onde se vira em muitos perigos, mas que nunca se vira em algum tamanho, como aquele, em que então se via, pelo estado em que a nau estava de podre, e a muita água que por estar aberta fazia”[lxxxiv].

Não obstante, após o conserto da nau em Moçambique, ela partiu novamente, passando a fazer água poucos dias depois, ao que, por nova ordem do governador, a embarcação tentou obter socorro junto à nau Águia e a nau Garça, que com ela seguiam, ao que acabou forçada a socorrer a nau Águia, que se encontrava em situação ainda pior que a Patifa, recolhendo seus tripulantes e arribando de novo a Moçambique, onde ficou estacionada para ser consertada, tendo alcançado terra firme por pura sorte, pois não enfrentou nenhuma tempestade, o que teria literalmente desmanchado a nau.
No entanto, nem sempre a sorte era generosa, a Patifa ficou “em Moçambique invernando, da segunda arribada[,] (...) por vir [tão] destroçada” que reparos mais aprofundados eram necessários em um estaleiro melhor equipado, partindo de volta à Índia em busca de “[conserto em] Goa”, sendo lá reparada a medida do possível e devidamente abastecida, “[fazendo] a vela aos onze de Agosto”, sendo o seu estado tão precário que no “dia seguinte começou a fazer água”, ao passo que, em 1560, tentando arribar novamente, “varou em terra (...) e se desfez”[lxxxv] de tão velha.
Na realidade, quando o dano comprometia a flutuação do navio, ele era remendado precariamente, quando muito, adiando o desastre que se anunciava.
Quase todos os tripulantes embarcados, como no caso da superlotação, tinham consciência e conhecimento deste fato, mas ninguém tomava qualquer atitude, o desejo pelo lucro falava mais alto.
Em 1593, os oficiais da nau São Alberto descobriram “danos [causados por ser] (...) a nau velha” pouco antes de rumarem para o Reino, mesmo assim, sabendo dos riscos que corriam, “dissimularam (...) e [enfeitaram] o dano de maneira (...) que [parecesse] bem consertado”, pois não queriam perder a monção e ter de adiar a partida para o próximo ano, no entanto, o fato de ter sido usada “madeira [cortada] fora do seu tempo e sazão”, estando à dita madeira “podre”[lxxxvi] e o navio sobrecarregado, fez com que o dano não tardasse em levar o navio a pique.
Quando não era o estado da madeira que causava a perdição, por sua idade avançada, o navio começava a apresentar sinais da necessidade de uma nova impermeabilização. Carregado excessivamente com pimenta, por menos água que se infiltrasse pelo casco, a dilatação das especiarias forçava a madeira de dentro para fora, muitas vezes fazendo o navio literalmente rachar ao meio.
Foi o que aconteceu com a nau São Bento, em 1554, quando “o peso da água que [penetrou] na nau, pelas partes que o mar arrebentava, veio de romaria a carga arrombando os paióis da pimenta”[lxxxvii], sendo a embarcação “logo partida pelo meio”[lxxxviii].
Embora fosse conhecido de todos que “[carregavam] ou [sobrecarregavam] na Índia as naus, com tanta cobiça, que [parecia] que não [esperavam] chegar [ao] (...) Reino, senão em fazendo vela irem-se a pique ao fundo”[lxxxix], sendo “as naus (...) feitas de madeira verde”[xc], até o advento da União Ibérica, inúmeros voluntários estavam empenhados em embarcar com destino ao Oriente em uma tentativa infrutífera de fazer fortuna.
Entretanto, a dita união da Coroa portuguesa a espanhola se encarregaria de agregar mais um perigo a rondar as naus da Índia, o assédio de piratas, espantando definitivamente os investidores e a mão de obra livre em benefício da nascente Carreira do Brasil.


A pirataria e a desarticulação do Império da pimenta.
A morte prematura de D. Sebastião, praticamente o último herdeiro direto da dinastia de Avis, terminou conduzindo Portugal para o inevitável julgo espanhol sob a égide de D. Felipe II, unindo a Coroa lusitana a castelhana e atraindo a ira dos inimigos da Espanha também em direção ao pequeno reino português, que então já enfrentava uma série de dificuldades que foram agravadas pelo assédio pirata financiado pela Inglaterra e Holanda.
Todavia, mesmo antes da União Ibérica, a cobiça anglo-holandesa já estava voltada para o Índico, há anos espiões transitavam incógnitos, ironicamente, nas embarcações portuguesas da Carreira da Índia, recolhendo informações sobre a rotina das armadas que anualmente iam para o Oriente.
O estilo de vida cosmopolita, suscitado pelo cotidiano marítimo, fazia com que estrangeiros inseridos em meio a tripulantes ou passageiros passassem quase despercebidos.
Os espanhóis estavam mais habituados às tentativas de espionagem e sabiam o quanto prejudiciais podiam ser infiltrações estrangeiras em meio aos tripulantes, isto porque eles próprios haviam se valido desta estratégia, sobretudo, no final século XV, visando alcançar os lusos, então na dianteira quanto à exploração marítima e o desenvolvimento técnico.
Por influencia espanhola, a partir de 1580, o aparelho Estatal português começou finalmente a prestar maior atenção à presença de estrangeiros em seus navios, porém, carecendo de mão de obra nacional, mesmo assim não pôde dispensar o potencial humano importado, tudo que fez foi apenas proibir a presença de estrangeiros de nacionalidade suspeita em determinadas rotas e períodos, leia-se ai homens pertencentes a nações inimigas da Espanha ou de Portugal, nada que espiões treinados não pudessem burlar com certa facilidade.
Em 1583, por exemplo, “três (...) ingleses (...)[,] mandados pela Companhia inglesa de Alepo para investigar se se poderia instalar qualquer feitoria em Ormuz”, foram descobertos por funcionários portugueses e “metidos na prisão” pelo “vice-rei”, ocorre que um “destes ingleses estivera em Ormuz anteriormente, e tinha [já] levado boas informações [ao seu país] acerca de tudo”, isto graças ao contato, não só, com os próprios portugueses, como também, com nativos, principalmente, mediante suborno com “bagatelas imagináveis (...)[,] tais como panos, açafrão, artefactos de vidro e pequenas mercadorias, como espelhos, facas e coisas semelhantes”, nunca tendo antes nenhum destes espiões levantado a menor “suspeita”[xci] sobre seu intento.
Foi justamente através destes espiões que ingleses e holandeses perceberam que os portugueses só poderiam ser expulsos do Oriente mediante a desarticulação do seu Império da pimenta.
Para concretizar este objetivo seria, antes, necessário cortar a ligação marítima entre Lisboa e Goa e, depois, obter o apoio dos nativos.
O assédio de piratas ingleses, entre 1585 e 1622, oficialmente foi responsável pelo naufrágio de 9 embarcações da Carreira da Índia, embora tenham sido travados 12 combates entre navios ingleses e portugueses neste mesmo período.
Em geral, quando atacadas por navios ingleses, as embarcações portuguesas terminavam sendo afundadas pelo inimigo após o saque da carga que transportavam, no entanto três casos foram exceções à regra.
Em 1591, dirigindo-se do Reino para Malaca, quando então não se encontrava por demais lotada, possuindo uma tripulação descansada e em condições de saúde adequadas para dar combate aos inimigos, a nau “S. Luís”, comandada por Dom Francisco Mascarenhas, “tomou uma nau inglesa”[xcii].
O exemplo da nau São Luís foi seguido pelo “capitão-mor” da armada de 1593, “Dom Luís Coutinho Canato[,] em S. Felipe”, que “a ida para o Reino pelejou com” três naus inglesas “que poucos dias antes haviam queimado a nau Chagas, pondo farol para que o seguissem”[xciii], apesar não ter conseguido afundar nenhuma das embarcações inimigas.
No entanto, devemos notar que, neste mesmo ano, embora a nau São Felipe tenha escapado dos piratas ingleses, os navios inimigos terminaram por saquear e levar ao fundo a nau “S. Pedro” que, “indo para o Reino[,] foi dar a costa do Brasil”[xciv].
O terceiro caso de confronto, de embarcações da Carreira da Índia com piratas ingleses que não resultou em naufrágio, é extremamente curioso, pois, “tomado de 6 naus inglesas junto à ilha de São Lourenço[,] sem bombarda de gente”, o comandante da “nau S. Carlos”, o “capitão-mor” da armada de 1618, “D. Cristovão de Noronha”, terminou optando por fazer um acordo com os piratas, pagando “de concerto noventa e duas mil patacas de direito de gentes”[xcv] para ter sua embarcação poupada pelo inimigo.
Temendo os ingleses, D. Cristovão preferiu pagar pedágio a eles, chegando “a Goa a 18 de Novembro”[xcvi] em segurança, “causa por que o vizo-rei mandou preso para o Reino o capião-mor e lhe tirou a capitania”, afinal ele “não quis pelejar com as naus inglesas, e se concertou com elas a dinheiro, e lhes deu muita soma que tomou dos cabedais dos mercadores”, por isso “morreu preso no Castelo”[xcvii].
O episódio, do pagamento de pedágio aos piratas ingleses pela nau São Carlos, não pode deixar de causar estranheza, pois, em geral, quando atacadas por piratas, as embarcações da Carreira da Índia procuravam sempre resistir, indo ao fundo em meio ao combate.
Foi o que aconteceu, por exemplo, com a “nau Chagas”, na “ilha do Faial”, quando ao encontrar “três naus da Inglaterra”, com elas “pelejou valorosamente”, ao que nada conseguiu impedir que “os ingleses com uma lança” lhe pusessem fogo, matando “toda a gente”, salvando-se apenas “treze dos portugueses”[xcviii].
Quando percebiam que não poderiam resistir por muito tempo, alguns capitães terminavam optando por queimar a embarcação para que o inimigo não pudesse se apoderar da carga, como, por exemplo, procedeu, em 1591, o capitão “António Teixeira de Miranda[,] em Stª Cruz” que, “a ida para o Reino na ilha do Corvo”, acabou optando por colocar “fogo” na sua embarcação “em razão dos ingleses”[xcix].
A morte era sempre preferida ao invés de entregar a carga aos piratas, pois, caso a embarcação caísse em mãos inimigas, o destino esperado pelos sobreviventes não era muito melhor, ao passo que tentativas de entendimento pacifico com os agressores resultavam sempre na punição exemplar dos responsáveis.
Seja como for, com base nas informações obtidas por espiões, os ingleses procuraram concentrar os ataques a Carreira da Índia quando as naus transitavam entre Goa e Lisboa, ou seja, quando vinham à volta, uma vez que estavam então carregadas com especiarias e outros produtos Orientais, como comprova o fato de 75% das embarcações da Carreira da Índia terem sido atacadas quando voltavam do Oriente, ao passo que apenas 3 embarcações foram atacadas na ida.
Além do motivo óbvio que levou os ingleses a procederem assim, este modo de operar teve também razões estratégicas, pois, enquanto na ida as embarcações lusitanas contavam com homens descansados e farta munição, na volta vinham sempre carregadas em excesso, com pouca munição e tripuladas por homens exaustos e famintos, o que dificultava a defesa do navio e garantia o sucesso de qualquer ato de agressão.
Destro desta linha de pensamento é significativo saber que os piratas ingleses operaram, sobretudo, nas águas do Atlântico norte, usando as possessões inglesas no Caribe como base de apoio, isto quando não a própria Grã-Bretanha, visando assim transitarem em navios conservados e bem equipados, cujos porões estavam sempre vazios a fim de poderem ser ocupados com o desejado botim, estando estas embarcações, portanto, leves, sendo por isto mesmo ágeis e rápidas, além de serem tripuladas por homens descansados, bem alimentados, dispostos e pesadamente armados.
Segundo testemunhas portuguesas, por esta época as “naus (...) inglesas (...) eram todas d´um porte de trezentas para quatrocentas toneladas, (...) estavam guarnecidas de muita gente de guerra, e muita artelharia grossa de bronze, de que cada nau tinha duas andainas, em que entravam canhões reforçados de bater, e de muitas armas, e petrechos de guerra, e eram naus de sorte, que podia cada uma só combater”[c] duas ou mais embarcações portuguesas e sair vitoriosa e ilesa.
Mesmo assim, em geral, os ingleses procuravam atacar as naus da Carreira da Índia em meio a grupos formados entre 3 e 6 navios, garantindo assim uma superioridade numérica sobre os portugueses.
O único registro de combate travado em igualdade de forças é justamente o caso anteriormente descrito em que uma embarcação portuguesa, comandada por Dom Francisco Mascarenhas, em 1591, tomou uma nau inglesa.
A situação se alterou parcialmente depois da suspensão dos ataques ingleses em 1594, por conta de uma trégua provisória que vigorou até 1613, quando então, depois que espiões recolheram informações mais precisas quanto às fortalezas lusitanas no Oriente, a penetração holandesa na área e a rivalidade anglo-batava forçou uma mudança radical na estratégia inglesa.
A despeito do último ato de agressão dos ingleses a Carreira da Índia ter sido registrado em 1623, a garantia de paz só foi definitivamente alcançada depois que a linha legítima de sucessão ao trono português foi restaurada, em 1640, por D. João IV. A paz com os ingleses foi ratificada em 29 de janeiro de 1642, através da assinatura do tratado de paz e comércio entre Portugal e Inglaterra e da entrega de Bombaim aos ingleses, um pouco mais tarde, pelo vice-rei da Índia, António de Melo de Castro[ci].
A paz em definitivo com Portugal viria a ser extremamente benéfica aos ingleses, pois, na segunda metade do século XVII, os interesses da Inglaterra iriam entrar em conflito direto com os interesses comerciais da Holanda, o que, pouco depois, iria dar inicio as guerras anglo-holandesas de 1652-1654 e de 1664-1667, cujo estopim foi à promulgação, por Cromwell dos Atos de Navegação em 1651.
Entretanto, os transtornos causados pelos ingleses à navegação da Carreira da Índia não foram nada comparados com o mal advindo do assédio dos piratas batavos.
A União Ibérica, somada a guerra travada pelos holandeses por sua independência da Espanha, criou uma excelente oportunidade para o inicio das hostilidades luso-batavas.
Foi justamente visando aproveitar esta situação que, em 1596, foi criada na Holanda a Vereinigte Oost Indische Compagnie (a Companhia das Índias Orientais) e, pouco depois, em 1621, a Companhia das Índias Ocidentais, as duas corporações de corsários que iriam dominar a economia holandesa a partir de então.
Na prática o assédio holandês sobre a Carreira da Índia demorou um pouco mais para ser concretamente iniciado, isto porque, embora os batavos possuíssem já informações valiosas, procuraram antes atualizá-las por meio de seus espiões e preparar uma frota frente a qual os navios portugueses não pudessem resistir.
Para tal precisaram formar uma mão de obra qualificada e estabelecer estaleiros que dessem conta deste intento, assim como recrutar homens de mar e de guerra, o que explica a demora de quase 20 anos antes de serem iniciados ataques às naus da Índia.
O primeiro ataque de piratas holandeses a Carreira da Índia foi registrado em 1599, embora tenha fracassado, ao passo que somente em 1600 as primeiras naus lusitanas da Índia começaram a ser afundadas pelos batavos, quando duas embarcações portuguesas foram a pique, tendo sido uma delas atacada “em Sesimbra” e a outra no Oriente, quando então se dirigia de “Chaul para Goa”[cii].
No total, os ataques dos holandeses foram responsáveis oficialmente pelo naufrágio de 21 embarcações lusitanas, o que corresponde a 65,62% das embarcações perdidas em meio ao ataque de piratas, mas, como no caso do assédio inglês, indícios apontam para o fato de que uma ampla margem do número de embarcações perdidas devido a causas desconhecidas terem na verdade afundado durante o ataque de piratas holandeses.
Todavia, apesar de terem sido oficialmente perdidas 21 embarcações portuguesas durante ataques de piratas holandeses, em linhas gerais foram travados 26 combates entre navios da Carreira da Índia e embarcações batavas, sendo que, em quatro combates circunscritos aos anos 1605, 1609 e 1612, igualmente quatro navios holandeses foram afundados por naus portuguesas da Índia.  
A exceção destes últimos casos, a desvantagem esteve sempre do lado português, não existindo registro de navios holandeses afundados pelos lusos a partir de 1613.
Na verdade, para além dos problemas internos enfrentados na Carreira da Índia, o volume de navios enviados pela Holanda para o Índico a partir de então, contraposto aos navios portugueses que transitaram entre Lisboa e Goa no mesmo período, tornaram impossível qualquer tipo de reação eficaz por parte dos lusos.
Enquanto entre 1610 e 1700 os batavos enviaram 1730[ciii] embarcações fortemente artilhadas para a Índia, os portugueses não despacharam mais que 331 naus, ou seja, para cada navio português que esteve presente no Índico mais de 5 navios holandeses estiveram em seu encalço, ao que em apenas 90 anos os holandeses conseguiram enviar um número 65% superior aos navios que seriam despachados pelos lusos ao longo de dois séculos.
Neste sentido é significativo notar que o número de naus da Carreira da Índia tendeu, em cada década, a cair na mesma proporção em que a Companhia holandesa das Índias Orientais manteve ou aumentou o número de embarcações enviadas à Índia.
Exatamente por este motivo, a guerra contra a Holanda foi travada de forma desigual, as embarcações portuguesas foram sempre atacadas por grupos numerosos de navios, muitas batalhas foram travadas contra dez e até mesmo quatorze navios holandeses para um único português.
De tão numerosos os inimigos, algumas vezes as embarcações portuguesas foram ao fundo não em meio ao fogo da artilharia holandesa, mas sim devido ao abalroamento com os inimigos, como foi o caso, por exemplo, da nau comandada por “Manuel M. Homem[,] em S. Nicolau”, que morreu junto com “Dom Fernando Mascarenhas e seu irmão Dom Pedro (...) abalroados de quatro naus holandesas”[civ].
Não bastasse a disparidade quantitativa, como ocorreu com relação aos ingleses, os portugueses estiveram sempre em desvantagem qualitativa, ao inverso da realidade vivida na Carreira da Índia, “as (...) naus [holandesas] (...) [tinham no mínimo] trinta e duas peças de artelharia de bronze (...) de sessenta quintais, que atiravam pelouros de vinte, e de vinte quatro libras de ferro coado, (...) [sendo os] navios de guerra feitos para isso”, por isto mesmo “providos de muitas invenções de armas, e polícias de guerra, e de tão grão cópia de munições de respeito, que depois de três dias de batalha [com um] galeão [português]”[cv], enquanto este ficava exaurido, praticamente não era sentida falta da munição na nau holandesa.
Cada nau da Holanda era tripulada por “perto de cem homens, que faziam ofício de soldados, marinheiros, e bombardeiros”, ou seja, que desempenhavam multitarefas, o que era uma “grande vantagem”[cvi] com relação aos navios da Carreira da Índia, algo que também fazia parte da tradição marítima lusitana, mas que o gigantismo das naus não mais permitia.
Navegando nestas condições, quando topavam com as podres naus lusitanas, os holandeses chegavam muitas vezes, inclusive, a dispensar o uso dos canhões, quando não abalroando os inimigos, como a pouco fizemos notar, optando por forçar um combate corpo a corpo, “pelejando com seus mosquetes e arcabuzes”[cvii], tomando a nau portuguesa, saqueando seu cabedal, que de tão volumoso era dividido entre vários navios batavos, e ponto fogo a embarcação, pois o estado destas naus era tão lastimável que nem ao menos valia a pena apreendê-las para uso da Holanda, como era então praxe.
Ocasião em que, algumas vezes, os tripulantes e passageiros portugueses eram poupados e deixados em terra para morrer e, em outras, queimados vivos junto com seu navio ou ainda, no caso de pessoas de posição de destaque, levados a Amsterdã para serem libertados mediante pagamento de resgate. 
Entretanto, ao contrário dos ingleses, os holandeses não tinham preferência por atacar as embarcações portuguesas na ida ou na volta.
Dentre os 26 ataques conhecidos a Carreira da Índia: 16 foram feitos a embarcações que voltavam do Oriente e 10 a navios para Lisboa.
Também ao contrário dos ingleses, os holandeses procuraram atuar, sobretudo, nas águas do Atlântico Sul e do Índico, sempre próximos a pontos estratégicos, prova disto é que dos 26 ataques efetuados pelos holandeses as embarcações da Carreira da Índia: 6 foram feitos nas proximidades de Malaca, 4 de Goa, 2 de Ormuz, 4 de Moçambique, 4 próximos a Ilha de Santa Helena (no Atlântico Sul), 4 nas proximidades da costa Ocidental da África, 1 na costa do Brasil e apenas 1 próximo a Sesimbra (em Portugal).
Assim, 61,52% dos ataques holandeses foram realizados nas águas do Índico, próximos da Índia, enquanto 34,62% ocorreram nas águas do Atlântico Sul e apenas 3,86% próximos da Europa ou no Atlântico Norte.
O que demonstra de forma clara que os ataques holandeses a Carreira da Índia visavam, sobretudo, desarticular o comercio português com o Oriente. 
Neste sentido, o assédio holandês foi muito mais incomodo do que o inglês.
Para se ter uma idéia da persistência do problema causado pelos ataques batavos em oposição à pirataria inglesa, mesmo depois que os portugueses restauraram sua independência em 1640, livrando-se do vinculo com a Espanha, o que bastou para costurar um acordo de paz com a Inglaterra, os ataques holandeses não cessaram.
Em 1641 foi assinada em Haia uma trégua entre os dois países que foi, contudo, ratificada somente um ano mais tarde, passando a vigorar na Ásia em novembro de 1644, porém, em se tratando da rota da Índia, este acordo nem sempre foi respeitado, isto principalmente pelos holandeses, tendo a pseudopaz durado apenas dez anos.
Nem mesmo o Tratado de Münster, assinado em 1648, o mesmo que pôs fim à guerra dos Oitenta Anos entre a Holanda e a Espanha, conseguiu acabar com as hostilidades entre portugueses e holandeses.
Na verdade, com a Índia, a África e parte do Brasil em jogo, pela altura da eclosão da revolta pernambucana de 1645, as hostilidades luso-batavas voltaram a se acirrar, o que conduziu ao fim da trégua entre os dois países em 1652.
A partir de então, os portugueses procuraram se aliar definitivamente a Inglaterra, selando o seu destino através do casamento do inglês Carlos II com Catarina de Bragança em 1661, sacrificando Bombaim e Tânger, entregues aos ingleses como parte do dote da nobre portuguesa.
Foi somente com a proteção dos ingleses e de sua poderosa armada que os lusos conseguiram estabelecer a paz com a Holanda em 1663, apesar dos termos da paz só serem fixados seis anos mais tarde em Lisboa e em Haia”[cviii].


Concluindo.
O corso e a pirataria inglesa e, sobretudo, holandesa terminou por cumprir seu objetivo, fosse ele secundário ou não, desarticular o Império português da pimenta.
Enfraquecido o poder naval lusitano, na África Oriental os holandeses conseguiram fundar uma colônia no cabo da Boa Esperança em 1652; na África Ocidental fixaram-se na Costa do Ouro e em Mouri em 1612, conseguindo privar os portugueses da maior parte do comércio de ouro africano, conquistando São Jorge da Mina em 1625, deixando a Portugal, na África, somente o controle sobre Angola, Benguela, São Tomé e Príncipe.
Simultaneamente, os holandeses foram responsáveis em grande parte pela queda da Carreira da Índia, abrindo caminho para que os próprios portugueses, gradualmente, entregassem voluntariamente a Índia de bandeja aos ingleses.
Efetivamente os pioneiros terminaram com quase nada, restando aos lusos o Brasil, sua colônia mais prospera e de maior potencial, mas, verdade seja dita, não fosse o assédio inglês e holandês, os problemas internos inerentes a Carreira da Índia, tal como a superlotação, o desgaste das naus, a falta de uma manutenção coerente, a má construção de novos navios por falta de matéria prima ou de mão de obra adequada, ou ainda a imperícia dos pilotos, somada a uma administração confusa e envolta em corrupção, entre outros problemas, teriam mais cedo ou mais tarde feito os portugueses perderem seus domínios para Nações mais organizadas.


Para saber mais sobre o assunto.
RAMOS, Fábio Pestana. Naufrágios e Obstáculos enfrentados pelas armadas da Índia Portuguesa: 1497-1653. São Paulo: Humanitas, 2000.
RAMOS, Fábio Pestana. No tempo das especiarias: o império da pimenta e do açúcar. São Paulo: Contexto, 2004.
RAMOS, Fábio Pestana. O apogeu e declínio do ciclo das especiarias: 1500-1700: uma análise comparativa das navegações portuguesas da Carreira da Índia e da Carreira do Brasil. Volume 1: Em busca de cristãos e especiarias. Santo André: FPR/PEAH, 2012.
RAMOS, Fábio Pestana. Por mares nunca dantes navegados: a aventura dos descobrimentos. São Paulo: Contexto, 2008.


Texto: Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.
Doutor em História Social pela USP.
MBA em Gestão de Pessoas.
Bacharel e Licenciado em Filosofia pela Universidade de São Paulo.







[i] RAMOS, Fábio Pestana. Naufrágios e Obstáculos enfrentados pelas armadas da Índia Portuguesa: 1497-1653. Apresentação da Prof.a. Dra. Laura de Mello e Sousa e Prefácio da Prof.a. Dra. Mary Del Priore, São Paulo: Editora Humanitas/Departamento de História-FFLCH/USP, 2000.


[ii] RAMOS, Fábio Pestana. No tempo das especiarias. São Paulo: Contexto: 2004.


[iii] BRITO, Bernardo Gomes de (compilação). História Trágico-Marítima (fac-símile da edição original de 1735/36). Lisboa: Afrodite, 1971 (2 volumes).


[iv] Ver: Ramos, Fábio Pestana. História e Literatura: ficção e veracidade. Domínios de Linguagem II: literatura em perspectiva. São Paulo: Edição dos Autores, p.25-39, 2003.


[v] Arquivo Histórico Ultramarino, Lisboa: Papéis Avulsos da Índia, Caixa: 1, 2, 3, 3A, 4, 4A, 5, 5A, 6, 7, 8, 8A, 9, 9A, 10, 10A, 11, 11A, 12, 13, 13A, 14, 14A, 15, 16, 16A, 17, 17A, 18, 18A, 19, 19A, 20, 20A, 21, 21A, 22, 22A, 23, 24, 24A, 25, 25A, 26, 26A, 27, 27A, 28, 28A, 29, 29A, 30, 30A, 31, 31A, 32, 32A, 33, 33A, 34, 34A, 35, 35A, 36, 37, 38, 38A, 39, 40, 41, 42.


[vi] Ver: RAMOS, Fábio Pestana. Os problemas enfrentados no cotidiano das navegações portuguesas da Carreira da Índia: fator de abandono gradual da rota das especiarias. Revista de História. São Paulo: FFLCH/USP, v.137, nº.2, p.75-94, 1997.


[vii] Ver: RAMOS, Fábio Pestana. O Império Marítimo Lusitano e o movimento de embarcações na rota do Brasil no século XVI e XVII. Humanitas. Campinas: PUC/ Campinas, v.9, n.1, p.13-29, 2006.


[viii] Ver: RAMOS, Fábio Pestana. A superação de obstáculos puramente técnicos nas navegações portuguesas da Carreira da Índia. Pós-História. Assis: UNESP, v.7, p.135-156, 1999.


[ix] Ver: RAMOS, Fábio Pestana. Por mares nunca dantes navegados. São Paulo: contexto, 2008.


[x] Ver: RAMOS, Fábio Pestana. A História Trágico-Marítima das crianças nas embarcações portuguesas do século XVI. História das Crianças no Brasil.São Paulo: Contexto, p.19-54, 2007.


[xi] RANGEL, Manoel. “Relação do naufragio da nao conceição de que era capitão Francisco Nobre a qual se perdeo nos baixos de Pero dos Banhos aos 22 dias do mez de agosto de 1555” In: BRITO. Op. Cit., volume 1, p.140.


[xii] Idem, Ibid.


[xiii] Anônimo. “Relação do naufragio da nao Santa Maria da Barca de que era capitão D. Luis Fernandes de Vasconcellos a qual se perdeo vendo da India para Portugal no anno de 1559” In: BRITO. Op. Cit., volume 1, p.254.


[xiv] AHU. (ARQUIVO HISTÓRICO ULTRAMARINO. Lisboa). Documento catalogado por Luiza Fonseca N.º 2255.


[xv] APEB. (ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA. Salvador). Fundo Leis, decretos e cartas régias, Regimentos dos Armazéns da Bahia n.º 627, f.08.


[xvi] Idem, Ibid.


[xvii] Idem, Ibid, f.57.


[xviii] AHU. Doc. cat. L. Fonseca N.º 2255.


[xix] APEB. Fundo Leis, decretos e cartas régias, Regimentos dos Armazéns da Bahia n.º 627, f.75.


[xx] AHU. Doc. cat. L. Fonseca N.º 3944.


[xxi] AHU. Doc. cat. L. Fonseca N.º 3157.


[xxii] AHU. Doc. cat. L. Fonseca N.º 1949.


[xxiii] AHU. Doc. cat. L. Fonseca N.º 3999.


[xxiv] AHU. Doc. cat. L. Fonseca N.º 1353.


[xxv] AHU. Doc. cat. L. Fonseca N.º 2250.


[xxvi] PERESTRELLO, Manoel de Mesquita. “Relação sumaria da viagem que fez Fernão alvares Cabral desde que partio deste Reyno por capitão mor da armada que foy no anno de 1553 as partes da India athe que se perdeo no Cabo da Boa Esperança no anno de 1554” In: BRITO. Op. Cit., volume 1, p.38.


[xxvii] Idem, Ibid, p.41.


[xxviii] LINSCHOTEN, Jan Huygen van. Itinerário, viagem ou navegação de Jan Huygen van Linschoten para as Índias Orientais ou portuguesas (1596). Edição preparada por Aries Pos e Rui Manuel Loureiro, Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 1997, p.316.


[xxix] Idem, Ibid.


[xxx] Idem, Ibid, p.312.


[xxxi] Idem, Ibid, p.318.


[xxxii] AHU. Doc. cat. L. Fonseca N.º 1329.


[xxxiii] DIAS, Henrique. “Relação da viagem, e naufragio da nao S. Paulo que foy para a India no anno de 1560” In: BRITO. Op. Cit., volume1, p.309.


[xxxiv] Idem, Ibid, p.291.


[xxxv] Idem, Ibid, p.292.


[xxxvi] FERNANDES, Álvaro. “Relação da muy notavel perda do galeão grande S. João em que se contão os grandes trabalhos, e lastimosas cousas que acontecèrão ao capitão Manoel de Sousa Sepulveda, e o lamentavel fim, que elle, e sua mulher, e filhos, e toda a mais gente houverão na Terra do Natal, onde se perderão a 24 de junho de 1552” In: BRITO. Op. Cit., volume 1, p.06


[xxxvii] Idem, Ibid, p.07.


[xxxviii] LAVANHA, João Baptista. “Relação do naufragio da nao S. Alberto no penedo das Fontes no anno de 1593” In: BRITO. Op. Cit., volume 2, p.564.


[xxxix] AMARAL, Melchior Estacio. “Tratado das batalhas e successos do galeão Santiago com os olandezes na Ilha de Santa Elena, e da nao Chagas com os inglezes entre as Ilhas dos Açores: ambas capitanias da Carreira da India; e da causa, e desastres, porque em vinte annos se perderão trinta e oito naos della” In: BRITO. Op. Cit., volume 2, p.793-794.


[xl] “Navios da Carreira da Índia (1497-1653), códice anónimo da British Library”  In: ALBUQUERQUE, Luís de (org.). Relações da Carreira da Índia. Lisboa: Alfa, 1989, p.11.


[xli] Idem, Ibid, p.136.


[xlii] PERESTRELLO, Manoel de Mesquita. “Relação sumaria da viagem que fez Fernão alvares Cabral desde que partio deste Reyno por capitão mor da armada que foy no anno de 1553 as partes da India athe que se perdeo no Cabo da Boa Esperança no anno de 1554” In: BRITO. Op. Cit., volume 1, p.42.


[xliii] LINSCHOTEN. Op. Cit., p.311.


[xliv] Idem, Ibid.


[xlv] THEMUDO, M. Rosário & CRUZ, Barata A. O sistema de distribuição das cargas nas Armadas da Índia.  Lisboa, Instituto de Investigação Cientifica/Separata da Biblioteca Central da Marinha portuguesa, 1988, p.31.


[xlvi] Idem, Ibid, p.52.


[xlvii] “Parecer sobre o tamanho das naus, encomendado pela Coroa Portuguesa, datado em 29 de setembro de 1623” In: BARCELLOS, Christiano. Construções de Naus em Lisboa e Goa para a Carreira da Índia no começo do século XVII. Lisboa: Separata da Biblioteca Central da Marinha portuguesa, 1898, p.47.


[xlviii] Idem, Ibid, p.23.


[xlix] Idem, Ibid.


[l] Idem, Ibid, p.19.


[li] LINSCHOTEN. Op. Cit., p.75.


[lii] Idem, Ibid, p.21.


[liii] Idem, Ibid, p.293.


[liv] FERNANDES. Op. Cit., volume 1, p.05.


[lv] Idem, Ibid, p.06.


[lvi] Anônimo. “Relação do naufragio da nao Santa Maria da Barca de que era capitão D. Luis Fernandes de Vasconcelos. A qual se perdeo vindo da India para Portugal no anno de 1559” In: BRITO. Op. Cit., volume 1, p.257.


[lvii] LINSCHOTEN. Op. Cit., p.293.


[lviii] CARDOZO. Op. Cit., volume 2, p.436.


[lix] LINSCHOTEN. Op. Cit., p.294.


[lx] Idem, Ibid, p.310.


[lxi] Idem, Ibid, p.311.


[lxii] AFFONSO, Padre Gaspar. “Relação da viagem e sucesso que teve a nao S. Francisco em que hia por capitão Vasco da Fonseca, na armada, que foy para a India no anno de 1596” In: BRITO. Op. Cit., volume 2, p.640-641.


[lxiii] PERESTRELLO. Op. Cit., volume 1, p.42.


[lxiv] “Documento datado em 1o. de Janeiro de 1622 pertencente ao acervo da Biblioteca Nacional do Concelho Ultramarino, maço 347” In: BARCELLOS. Op. Cit., p.19.


[lxv] COUTO, Diogo do. “Relação do naufragio da nao S. Tomé na terra dos fumos, no ano de 1589” In: BRITO. Op. Cit., volume 2, p.509.


[lxvi] Idem, Ibid, p.510.


[lxvii] Idem, Ibid, p.509.


[lxviii] Idem, Ibid, p.510.


[lxix] Idem, Ibid, p.520.


[lxx] XAVIER, Padre Manuel. “Compêndio de todos os vizo-reis e governadores do Estado da Índia” In: ALBUQUERQUE. Op. Cit., p.103.


[lxxi] “Navios da Carreira da Índia” Op. Cit., p.10.


[lxxii] XAVIER. Op. Cit., p.110.


[lxxiii] Idem, Ibid, p.114.


[lxxiv] Idem, Ibid.


[lxxv] Idem, Ibid, p.117.


[lxxvi] Idem, Ibid, p.120.


[lxxvii] Idem, Ibid, p.142.


[lxxviii] Idem, Ibid, p.144.


[lxxix] Idem, Ibid, p.149.


[lxxx] Idem, Ibid, p.156.


[lxxxi] AHU. Doc. cat. L. Fonseca N.º 988.


[lxxxii] PRAULT, Pierre “Description de la ville de Lisbonne (1730)” In: CHAVES, Castelo Branco (tradução, prefácio, e notas). O Portugal de D. João V. visto por três forasteiros. Lisboa: Biblioteca Nacional, 1989, p.43.


[lxxxiii] BARRADAS. Op. Cit., volume 1, p.181.


[lxxxiv] Idem, Ibid, p.184.


[lxxxv] Idem, Ibid, p.202.


[lxxxvi] LAVANHA. Op. Cit., volume 2, p.567.


[lxxxvii] PERESTRELLO. Op. Cit., volume 1, p.45.


[lxxxviii] Idem, Ibid, p.48.


[lxxxix] AMARAL. Op. Cit., volume 2, p.810.


[xc] Idem, Ibid, p.815.


[xci] LINSCHOTEN. Op. Cit., p.279.


[xcii] Idem, Ibid, p.140.


[xciii] Idem, Ibid, p.141.


[xciv] Idem, Ibid.


[xcv] Idem, Ibid, p.155.


[xcvi] Idem, Ibid.


[xcvii] “Navios da Carreira da Índia”. Op. Cit., p.69.


[xcviii] XAVIER. Op. Cit., p.141.


[xcix] Idem, Ibid, p.140.


[c] AMARAL. Op. Cit., volume 2, p.796.


[ci] Idem, Ibid, p.195.


[cii] Idem, Ibid, p.144.


[ciii] O numero de navios holandeses foi quantificado por J. Brugmans (em seu The Dutch Seaborne Empire) e obtido a partir de dados fornecidos por LOPES, Antônio; FRUTUOSO, Eduardo & GUIONTE, Paulo. “O movimento da Carreira da Índia nos séculos XVI-XVIII” In: I Simpósio de História Marítima: as navegações portuguesas no Atlântico e o descobrimento da América. Lisboa: Academia da Marinha, Dezembro de 1992, p.255.


[civ] XAVIER. Op. Cit., p.146.


[cv] AMARAL. Op. Cit., volume 2, p.743.


[cvi] Idem, Ibid.


[cvii] Idem, Ibid, p.750.


[cviii] Idem, Ibid, p.118.

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Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.

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