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segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

A importância da ludicidade no ensino da matemática nas séries iniciais.


Para entender a história... ISSN 2179-4111. Ano 3, Volume fev., Série 06/02, 2012, p.01-12.

O presente artigo faz parte da Monografia de Conclusão de Curso de Pós-Graduação em Psicopedagogia Institucional pelo INEC/Universidade Cruzeiro do Sul, orientada pelo Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.


Este artigo surgiu da necessidade de demonstrar a importância do lúdico no ensino da matemática para alunos do 1° ao 3° ano do ensino fundamental, por ser nesta faixa etária que os alunos, por sua natureza se mostram mais receptivos àquilo que pode ser concreto e visual.
Pensando nos alunos que recebemos hoje na escola, tão dinâmicos e cheios de informações, vindas de diferentes realidades, surge entre nós professores a ânsia de progredir com estes conhecimentos, aprimorando-os para que encontrem sua eficácia no dia a dia destes pequenos.
Como estão na fase de alfabetização, muitos alunos, antes mesmo de “ decifrarem”  o mundo escrito que os rodeiam, já convivem com a matemática em várias situações de seu cotidiano.
O ensino da matemática, por ser uma ciência exata, nos remete ao erro de pensarmos em uma única maneira de chegarmos a uma resposta, quando na verdade as possibilidades e caminhos para isso são inúmeras.
Para as crianças, nos primeiros anos de escolaridade, entender o que é a matemática e suas funções na vida diária é muito abstrato e neste momento o lúdico se faz presente, pois este sim, faz parte do contexto de infância da criança, afinal, brincar faz sentido para ela.
Em contraponto estão os professores, que se empenham em ensinar os conteúdos pré estabelecidos por um currículo, pouco flexível, tendo como seu único instrumento, o conhecimento da sua época escolar.
Conhecimento este, muitas vezes não atualizado com o passar dos anos e que não acompanham esta turminha do século XXI.
Desta forma acontecem os conflitos sobre o que e como ele (o professor) aprendeu matemática, as novas idéias sobre este ensino, o conhecimento que os alunos trazem e dentro disso como transmitir o conteúdo curricular.
Assim neste artigo procurei desvendar um pouco mais o mistério que envolve a matemática e fazer-nos pensar em como deixá-la mais branda, mas não menos eficaz, buscando sua funcionalidade no cotidiano das crianças.


A importância do lúdico através dos tempos.
Para entendermos melhor a importância do lúdico através dos tempos, voltaremos o olhar aos pensadores e defensores do lúdico da antiguidade.
A ludicidade sempre fez parte da vida dos seres humanos desde os povos primitivos, porém esta não era tida como forma de prazer , mas sim parte de suas obrigações diárias.

Eis alguns filósofos e pensadores e suas idéias sobre o lúdico:
Platão ( 427- 348) apud. Paulo Nunes de Almeida- 1998, afirmava que os primeiros anos da criança deveriam ser ocupados com jogos educativos, praticados em comum pelos dois sexos, sob vigilância e em jardins da infância.
Platão introduziu também, uma prática matemática lúdica. Ele aplicava exercícios de cálculos ligados a problemas concretos da vida e dos negócios.
Montaigne (1533 - 1592): Fazia a criança ter a curiosidade pelas coisas ao seu redor;
Comênio (1592- 1671): Tinha três idéias que foram a base da nova didática: naturalidade, intuição e auto-atividade;
Rosseau: (1712 - 1778): Demonstrou que a criança não aprende nada senão por uma conquista ativa.
Pestalozzi (1746 - 1827): Defende que o jogo é um fator decisivo que enriquece a responsabilidade e fortifica as normas de cooperação.
Froebel (1782 - 1852): Estabelece que a pedagogia deve considerar a criança como atividade criadora e despertar, mediante estímulos, suas faculdades próprias, para criação produtiva.
Com Froebel se fortalecem os métodos lúdicos na educação.
Dewey (1859 - 1952): Para ele o jogo faz o ambiente natural da criança e as referencias abstratas não correspondem ao interesse da criança.
Maria Montessori (1870 - 1952): Remonta as necessidades dos jogos educativos de Froebel para educação de cada um dos sentidos. Os jogos “sensoriais”.
Jean Piaget: Piaget acredita que os jogos não são somente forma de distração para as crianças, mas sim meios que enriquecem o desenvolvimento intelectual.
Conclui: “Os métodos de educação das crianças exigem que se forneçam a elas um material conveniente, afim de que jogando, elas cheguem a assimilar as realidades intelectuais que sem isso permanecem exteriores à inteligência infantil” (Op.cit. p.158 ).
Georges Snyders: Caracteriza o jogo como uma atividade séria que exige esforço, porém sem perder o prazer de brincar.
Paulo Freire: Considera  o conceito do trabalho – jogo e segue o pensamento de Makarenko e Snyder, tendo como princípio que apesar de penoso ou trabalhoso que o aprendizado possa parecer deve-se ter prazer e alegria em fazê-lo.

Como vemos a ludicidade esteve presente desde muito tempo e por diferentes pontos de alguns pensadores.
O lúdico traz ao cotidiano das crianças, o prazer de ser criança, de realizar fantasias e se divertir, sendo então de suma importância em seu desenvolvimento mental e social.

“O jogo é tão importante na vida da criança como o trabalho para o adulto” (MAKARENKO, 1981,  p.47)


A didática da matemática nos dias de hoje.
Como vimos muitos foram os pensadores que colocaram em discussão a importância do lúdico através dos tempos, mas foi depois de Piaget (1896 - 1980) e Vygotsky (1896 - 1934) com a psicologia do desenvolvimento e da abordagem socioconstrutivista, que essas discussões se intensificaram.
No Brasil e no mundo,surgiu uma grande preocupação com o baixo rendimento dos estudantes em matemática, e em busca de soluções para as dificuldades dos alunos novas propostas e estudos foram construídos, daí surge a didática da Matemática ou Educação Matemática, como é mais conhecida no Brasil.
O professor neste contexto, passou de simples transmissor de conteúdos, para mediador do conhecimento entre os alunos.
Já não é mais o único a manter o saber absoluto e agora tem o papel de desafiar seus alunos para que com suas próprias construções sejam capazes de progredir em seus aprendizados.
No livro Didática da Matemática, Roland Charnay afirma: "O aluno deve ser capaz não só de repetir ou refazer, mas também de resignificar diante de novas situações, adaptando e transferindo seus conhecimentos para resolver desafios".
Dentro das novas perspectivas no ensino da matemática muitos autores enfatizaram a importância dos jogos neste novo processo. Constance Kamii, natural de Genebra , filha de pais japoneses e seguidora de Piaget, trata das questões da natureza do número, princípios de ensino, a prática pedagógica dos professores entre outros assuntos.
Enfatiza a importância do conceito de quantidade e as suas múltiplas aplicações na vida das nossas crianças, com todas as consequências pedagógicas.Parte da afirmação de Piaget "O jogo é um tipo de atividade particularmente poderosa para o exercício da vida social e da atividade construtiva da criança".
Assim pontua nos seus trabalhos os jogos em grupo, como fator de importância para o desenvolvimento da capacidade cognitiva e interpessoal, sendo mais eficiente e prazeroso, do que folhas de exercícios e atividades similares.
"A crescente capacidade de jogar em grupo é uma conquista cognitiva e social de grande importância…que deve ser encorajada antes dos cinco anos e estimulada depois dessa idade".
Vê a "autonomia" como finalidade da educação. (http://www.wook.pt/authors/detail/id/10556)


Matemática: será mesmo a vilã da história?
Será mesmo que o aprendizado da matemática tende a ser menos prazeroso e mais árduo que as outras disciplinas.
É natural ouvirmos pessoas dizerem que sua maior dificuldade é aprender matemática.
Cálculos, resolução de problemas, raciocínio lógico etc, são verdadeiros enigmas e desafios.
Vivemos um problema cultural no qual crescemos escutando os professores, em sua maioria, passar informações sobre cálculos e operações que na maioria das vezes não ultrapassava os muros da escola, pelo menos não dá forma como nos era transmitido.
Contas serviam para resolver os problemas passados na lousa, com o primeiro sendo exemplo. E os problemas me pareciam que serviam para treinar nosso poder de adivinhação em qual contas usar.
A matemática sempre nos foi ensinada como algo paralelo ao mundo real.
Durante muito tempo se acreditou que o aluno é uma tábua rasa, que só recebe informações, as vai acumulando, e no momento certo (geralmente a hora da prova), este aluno deve “despejar” tudo aquilo que aprendeu para que o professor (usando sua potente caneta vermelha) lhe concederá uma nota, depois de avaliar seus erros.
Este ponto de vista vêem cada vez mais sendo discutido e questionado por muitos pensadores da matemática, pois é cada vez mais claro que os alunos estão chegando à escola com muitos questionamentos e não aceitam a informação dada pela professora como única e correta, eles trazem em sua mochila escolar, muito mais que lápis e cadernos, trazem indagações e hipóteses do mundo em que vivem e pelo qual diariamente são desafiados, seja no jogo do celular, na internet ou em um simples canal da televisão.
Dentro deste contexto, visualizar os professores como únicos donos dos saberes já nos remete no pensamento aulas chatas, fora de sentido real e pouco estimulantes, o que provavelmente formará alunos que não gostem de matemática.
A ideia da contextualização no ensino da matemática vem oferecer o mundo real dentro da sala, com situações que oportunizem aos alunos falarem sobre seus conhecimentos prévios e aprimorar suas ideias pela intervenção do professor.
Lerner e Sadorsky (1996) - apud Ana Ruth Starepravo -, em estudo sobre a compreensão do sistema de numeração decimal por crianças em idade pré-escolar, constataram que as crianças elaboram critérios próprios para produzirem representações numéricas e que a construção das notações convencionais não segue a ordem da sequência.
Isso ocorre porque fora da escola as crianças convivem com números e estes não se apresentam em partes.
O número de sua casa, por exemplo pode ser bem maior que dez, então porque na escola a criança tem que aprender os números na sequência numérica convencional?
Será que tendo o número de sua casa 221, a criança na escola tem que saber até o 100 para só então descobrir o 200?
Quando a criança é levada a levantar hipóteses e poder observar as hipóteses dos colegas, encontra maiores possibilidades de confrontar seus conhecimentos e construir novos conceitos o que a leva para o caráter ativo da aprendizagem.
Para Piaget, conhecer é agir sobre um objeto, é modificar, transformar o objeto e entender o processo desta transformação (apud. Ana Ruth Starepravo).
O lúdico, neste contexto, se apresenta na matemática das séries iniciais como um importantíssimo instrumento para a criança colocar em jogo seus conhecimentos, visto que, de maneira informal, o aluno se sente mais a vontade para se expor seus pensamentos.
             

Quem são os alunos do século XXI?
Retomando a um passado já um pouco distante, quando falávamos em sala de aula, nos vem na memória carteiras enfileiradas, alunos uniformizados atentos à explicação de uma professora com olhar frio a sua lousa ou um livro.
Nesta lousa há um texto longo de ponta a ponta para ser copiado nos mínimos detalhes.
Neste ambiente, o silêncio impera e os questionamentos não existem.
O erro era encarado como falta de atenção ou respeito sendo motivos para diversas punições tanto físicas como vexatórias.
O professor imperava como único proprietário do saber e do conhecimento.
Com a evolução da espécie humana durante os anos, muitos foram os pensadores que começaram a questionar sobre a educação oferecida, e então estudar sobre o assunto.
Hoje ao entrarmos em uma sala de aula, na maioria da vezes, observamos crianças falantes e inquietas, geralmente pouco interessada em seus deveres, muito questionadoras e dinâmicas em seus pensamentos e associações.
O professor nesta sala, encontra-se, muitas vezes, desmotivado e sem animo para transformar ou agir sobre este novo perfil de criança, em seu conceito muito indisciplinadas e desatentas.
O professor por estar acostumado em ser o possuidor do conhecimento não identifica o que os alunos de hoje trazem em sua “bagagem pessoal”, aprendidos em casa, em socialização com os amigos ou através das novas tecnologias disponíveis em toda a sua volta.
Suas aulas, então, restringem-se a conceitos ultrapassados e formas de ensino que não são atrativas e se distanciam da realidade apresentadas pelos alunos.
Daí as tais “indisciplinas” são geradas e o desconforto se faz entre as partes.
Estamos em uma era de conflitos entre pais, filhos e professores.
Pais acreditam que é na escola o lugar para se ensinar bom comportamento, quando educação deve vir de casa.
Também não é de agrado destes pais, cadernos sem conteúdos e lousas vazias, mesmo que a nova proposta seja eficaz, falta conteúdo e para muito deles a professora está fazendo “corpo mole”.
Por parte dos professores, estão em sua maioria descontente com salários, e valorização de seu trabalho, quando o que deveria imperar seria o amor por sua profissão.
Claro que todo o resto é importante, porém àquela criança que lhe foi confiada, não tem culpa do sistema e tem direito a aprender.
Os alunos, por sua vez, encontram na escola um lugar para encontrar os amigos, merendar e ouvir aulas que para ele nada lhe acrescente em sua vida cotidiana, está ali para estudar quando tem prova e acertar o máximo de questões que ele lembrar ou que a sorte permitir.
Falta interesse de todos os lados.
A criança de hoje é esperta, dinâmica, questionadora, desafiadora e vive em um mundo virtual, onde a tecnologia está por todos os lados.
O aluno inquieto quer saber e não gosta de repetições.
Está dentro da sala de aula sempre testando o professor, os colegas e a si próprio, avaliando até onde pode ir com os seus conhecimentos.
Qual adulto hoje já não se perguntou: “Na minha época isso não existia”. ou ainda “A criança daqui à alguns anos nascerá falando!”.
A criança da era moderna é ativa, informatizada pela televisão, internet, celulares e etc.
Tem dentro de si um cartão de memória, funções e aplicativos próprios, que ultrapassam nosso entendimento.
E se não corrermos atrás das atualidades que nos cercam, ficaremos fora do olhar de admiração de um aluno.
Antigamente um aluno leria e copiaria dez vezes a frase: “O bebê baba.”.
Hoje as questões seriam várias: “Por que ele baba? “, “ O bebê é seu filho? “, “ Qual o nome do bebê?”. “Ele não tem um babador?”
Precisamos perceber que junto com a passagem do tempo, muitas mudanças no ensino também aconteceram, as crianças foram estudadas por muitos pensadores sobre o assunto, na sua forma de pensar e como aconteciam os mecanismos de aprendizado.
Dentro deste contexto o trabalho com o lúdico se torna um aliado importante e indispensável no aprendizado dos alunos, principalmente nas séries iniciais, momento pelo qual o interesse e a vontade de aprender, se acentuam sem deixar de ser a criança para ser somente o aluno.
O que nós professores temos que nos conscientizar é que nossos alunos das séries iniciais antes de tudo são crianças com desejos próprios da idade.
O lúdico na sala de aula traz a tona o estímulo necessário para o aprendizado do aluno, como o prazer em aprender conceitos dentro do seu próprio mundo, o que posteriormente será transmitido ao seu mundo adulto.
Resumindo a criança do século XXI, não é a mesma de alguns anos atrás, questiono então porque o aprendizado desta criança teria que ser igual?


Os jogos como aliados no processo da aprendizagem matemática.
Muitas são as brincadeiras que cercam o mundo da criança e que podem ser boas estratégias para o ensino da matemática, tais como: amarelinha, pular corda, etc.
Porém ressaltarei aqui, a ludicidade trazida pelos diferentes tipos de jogos.
Os jogos aparecem de várias formas: os jogos de estratégia, de sorte, rapidez, associação, raciocínio e etc, e todos eles podem ser aliados no ensino da matemática principalmente nas séries iniciais.
O lúdico dos jogos traz para as aulas, não somente a diversão, mas muitos outros aspectos são trabalhados como: atenção, socialização,cumprimento de regras e o aprendizado do próprio jogo.
Jogando os alunos são desafiados com a intenção da vitória e coloca seus conhecimentos à tona, aprimorando-o e modificando-os através de sua capacidade de reflexão quanto as jogadas feitas.
Além disso, os jogos por serem objetos reais e trazerem metas concretas e objetivos próprios colocam os alunos em verdadeiras situações de aprendizagem, utilizando a vivência real do que lhe é proposto.
Em outras palavras o jogo é uma realidade própria da criança e a proposta de trabalhar com eles e a matemática faz com que seus conteúdos saiam, por exemplo, da rotina de resolverem contas intermináveis e sem contexto em busca do resultado correto, e utilizem o procedimento de cálculo com o objetivo de vencer um desafio, neste caso o do jogo.
O mundo dos jogos é atrativo ao aluno, pois através dele, as crianças podem colocar suas aprendizagens e hipóteses, sem serem cobrados por isso.
Trazem suas dúvidas, questionamentos, fazem  tentativas, acertam, erram, se surpreendem, se frustram, raciocinam, mudam de estratégias, se arriscam e constroem novos conhecimentos a medida que vão evoluindo em seus aprendizados, se tornando assim, não mais receptores de conteúdos prontos e definidos mas construtores de seus próprios pontos de vista ,exercitando sua autonomia em busca de novos desafios.
Pesquisadores como Kamii e Devries (1991), Kamii e Joseph (1995), Kamii e Livington (1995), Kamii e Housman (2002) apresentam as vantagens significativas do uso de jogos no trabalho com a matemática nas séries iniciais (aput Jogando com a Matemática: números e operações: Ana Ruth Starepravo).
Entre outras questões, a autora Kamii, salienta que os jogos podem substituir atividades enfadonhas como folhas de intermináveis “contas” que acabam sendo bastante repetitivas, uma vez que basta aplicar uma técnica específica para resolvê-las.
Quando jogam, as crianças devem realizar cálculos mentais e eles não são aleatórios nem desvinculados de um contexto maior.
Há um objetivo para se realizar tais cálculos, objetivo este que nas folhas de intermináveis, cálculos não passam do mero treino dos algoritmos convencionais (apud: Ana Ruth Starepravo).
Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática apontam como aspecto mais relevante no trabalho com jogos o fato de que provocam desafios genuínos nos alunos, gerando interesse e prazer e, por isso mesmo,recomendam que eles façam parte da cultura escolar. Assim, os jogos não devem ser atividades “extras”, usados apenas depois que o professor já “venceu o conteúdo proposto” (apud: Ana Ruth Starepravo).
Então devemos encarar a utilização dos jogos como mais um instrumento a ser usado para atingir a meta estabelecida, explorando seus desafios, avaliando as estratégias usadas pelos alunos e ampliando os conhecimentos adquiridos.


Garantindo uma boa aula com jogos.
Quando falamos em jogar com os alunos em sala de aula, já imaginamos crianças inquietas, andando de um lado para o outro, brigando entre si, com peças espalhadas pelo chão e enfim uma bagunça generalizada, onde a função do jogo não acontece como o planejado.
Porém algumas preocupações devem acontecer no planejamento do professor, quando se refere ao trabalho com jogos.
Primeiramente o professor deve ter em mente que o jogo será realizado como estratégia de ensino de um determinado conteúdo e por isso deve oferecer um desafio possível aos alunos, isto é, o desafio não pode ser muito fácil para não desestimular os alunos, nem tão difícil ao ponto de não conseguirem ser resolvidos.
Para identificar este meio termo o professor deve fazer uma sondagem antecipada sobre o que seus alunos já sabem sobre o conteúdo a ser proposto e o que ele quer que seus alunos aprendam ou aprofundem.
Posteriormente o professor deve conversar com a sala e estabelecer combinados para os momentos dos jogos, tais como: respeito à vez dos colegas, respeito às regras, organização ao chamar o professor e etc.
No momento do jogo as regras do mesmo devem ser passadas de forma simples e deve-se certificar que todos os alunos entenderam sobre as mesmas.
Durante a atividade o professor deve andar pelos grupos ou duplas e acompanhar o processo pelo qual os alunos formam suas estratégias e fazem suas jogadas, quando achar necessário deve fazer intervenções e questionamentos , não a fim de avaliar o aluno, mas sim colocar em “xeque” o que ele sabe ou o que pode ampliar em seu conhecimento.
Lembrando que é na instabilidade que o aluno progride, se seus conhecimentos assim permitirem.
Para avaliar a produtividade do jogo os alunos podem fazer registros escritos ou através de desenhos dependendo do deu grau de maturidade, e ainda o professor pode propor questões que os alunos possam responder com base no que aprenderam.
Situações do próprio jogo são ótimas estratégias de verificação.
Desta forma os jogos devem ser escolhidos por seus conteúdos e desafios condizentes com os objetivos do professor.
Os jogos podem e devem ter vencedores, mas esta não deve ser a principal função de se jogar, por outro lado a competição não deve ser desprezada, pois é através dela que acontecem os estímulos para que o jogo aconteça de forma prazerosa.
Com toda esta carga de responsabilidade sobre os jogos, não devemos esquecer que antes de serem instrumentos de aprendizagem, são fontes de alegria e diversão, por isso deixar os jogos só para o aprendizado também não será uma boa escolha, pois este se tornará cansativo e exaustivo.
Dentro do cronograma escolar o professor deve deixar um tempo para que os alunos brinquem por brincarem, pois este ato também faz parte da infância e traz benefícios mentais tão eficazes quanto o aprendizado em si.


Sugestões de jogos matemáticos.

BORBOLETA *
Este jogo pode ser usado para que os alunos aprendam a fazer cálculo mental, a resolver problemas envolvendo adição e fazer comparação de quantidades.
Organização da sala: em grupos de quatro alunos
Recursos necessários: todas as cartas de um baralho, exceto reis, damas e valetes.
Meta: conseguir formar o maior número de conjuntos de cartas com uma dada soma.
Anos: 2°, 3° e 4°

Regras:
  1. Cada jogador recebe três cartas que devem ficar viradas para cima, à sua frente durante toda a partida.
  2. Outras sete cartas são também colocadas com face para cima, em uma fileira no centro da mesa, e as demais ficam em um monte para reposição.
  3. Na sua vez, o jogador deve pegar as cartas do meio que forem necessárias para que consiga chegar ao mesmo total que o de suas três cartas.
  4. Quando ele não mais conseguir formar conjuntos com a sua soma, deve repor as cartas que usou do meio com outras do monte e passar a vez ao próximo.
  5. Ao final do jogo, quem obtiver mais conjuntos de cartas com as suas somas será o vencedor.

Problematizações possíveis:
¨      As cartas de Lucas são 3, 5, 9. Qual é a soma dele durante o jogo?
¨      Paula tem sempre que formar 17. As cartas na mesa na sua vez de jogar são 3, 5, 6, 9, 1, 10, 4. Quais cartas ela pode pegar para conseguir sua soma?

Variações:
  1. Pode ser jogado com quatro cartas para cada jogador e nove cartas no centro da mesa.
  2. Em vez de adição pode-se fazer uma multiplicação com o valor das três cartas. Nesta versão o jogo é mais indicado ao 4° ano.

UM EXATO *
Este jogo auxilia a reconhecer e nomear números naturais, a justificar respostas e o processo de resolução de um problema e efetuar adições e subtrações mentalmente.
Organização da sala: em duplas
Recursos necessários: quadro de centena numerado, três dados e 15 marcadores de cores diferentes para cada jogador.
Meta: conseguir chegar exatamente ao 1.
Anos: 2°e 3°

Regras:
  1. Cada jogador coloca o seu marcador na casa de número 100 do quadro de centena.
  2. Os jogadores revezam-se lançando os três dados e somando ou subtraindo os resultados, conforme acharem melhor.
  3. Se um jogador obtém 20, por exemplo, com a soma dos três dados, subtrai esse valor mentalmente de 100 e coloca um dos seus marcadores no 80 e não tira mais o marcador de lá.
  4. O mesmo procedimento é realizado pelo próximo jogador, mas se ele também obtiver o valor 20 não poderá colocar o seu marcador no 80 pois já tem um marcador do oponente. Nesse caso ele terá que passar a vez e continuar onde estava antes da jogada. Isso significa que o jogador antes de dizer o resultado da conta feita com seus dados precisa cuidar para não chegar ao valor de uma casa já marcada.
  5. Se o jogador avaliar que não é possível chegar a uma casa de menor valor que aquela que ele estava e que não estava marcada, passa a vez.
  6. O objetivo do jogo é seguir até o 1, exatamente. Se o jogador não conseguir chegar a 1, a partida continua até que alguém o atinja exatamente.

DOMINÓ DE FRAÇÕES*
Esse jogo favorece a compreensão das diferentes representações de frações.
Organização da sala: quartetos
Recursos necessários: as peças do dominó de frações.
Meta: ser o primeiro a descartar todas as peças
Anos:  3° e 4° ano.

Regras:
  1. Os jogadores decidem a ordem e quem começa a jogar.
  2. embaralham as cartas e distribuem igualmente entre os jogadores
  3. O primeiro jogador coloca um de seus dominós sobre a mesa.
  4. O segundo jogador deve colocar uma peça que tenha uma das “pontas” igual a das peças já colocadas na mesa. Se não tiver uma, passa a vez.
  5. Vence o jogo aquele jogador que conseguir bater, ou seja, colocar todos os seus dominós na mesa em 1° lugar.


* Os jogos aqui sugeridos foram retirados do livro: Smole, Kátia Stocco; Ignez Diniz, Maria; Candido, Patrícia; Caderno do Mathema. Jogos de Matemática de 1° a 5°ano. Artmed: 2007


Concluindo.
Retomando tempos passados e comparando com a realidade que nos cerca nos dias de hoje, pude concluir que o lúdico faz parte da vida dos seres humanos desde os tempos mais remotos.
Ora criticado, ora apoiado.
Ora somente como forma de prazer, ora como objeto de estudo e trabalho.
Sua importância se faz clara mediante as expectativas cada vez mais dinâmica de nossos alunos.
Este lúdico associado ao ensino da matemática traz ao aluno o desafio de colocar em prática seus pensamentos e hipóteses sem medo de ser reprimido ou corrigido.
No jogo o aluno sofre as conseqüências de sua escolha, cria novas estratégias, raciocina sobre o que lhe é passado.
Ao professor, quando bem utilizado, o lúdico auxilia-o em descobrir o que de fato o aluno sabe, criando subsídios para seu trabalho posterior, desperta o interesse deste aluno para o conteúdo trabalhado, fazendo-o utilizar a matemática como estratégia para solucionar problemas, cria condições de socialização entre os alunos, discute regras e propõem novas soluções, tudo isso sem que a aula seja temida ou frustrante.
O jogo traz autonomia aos alunos de forma que, cada vez mais, vai utilizando seu aprendizado para progredir em seus conhecimentos.
Acredito que a matemática pode ser bem melhor explorada através de contextos significativos, jogos e brincadeiras, pois trazendo o conteúdo que era meramente decorado, explicado e treinado, como algo que faz sentido e pode ser utilizado na vida prática, faz do aluno um ser pensante e atuante nos mais diferentes contextos.
Claro que nem todos os conteúdos matemáticos poderão ser transmitidos através de jogos e brincadeiras, mas cabe ao professor atuar como pesquisador e procurar aprender cada vez mais estratégias lúdicas para atingir seus objetivos, trazendo a sua aula mais dinâmica e verdade.
Por fim enfatizo o ensino da matemática utilizando o lúdico para alunos das séries iniciais, não somente por ter mais experiência com esta faixa etária e notar mais claramente a ansiedade dos alunos em aprender, mas também por acreditar que é nesta fase que as crianças se mostram mais curiosas e menos resistentes a “entrar na brincadeira”, por isso então iniciam seus aprendizados de matemática sem traumas e cobranças desnecessárias, afinal nós professores temos que lembrar a todo momento que o aluno não é uma caixa vazia onde acreditamos guardar todos os ensinamentos que julgamos válidos e importantes, mas sim uma cartola mágica, da qual não sabemos ao certo o que vai surgir, mas podemos usar o truque da magia para impressioná-los cada vez mais.  

“Como professor não me é possível ajudar o educando a superar sua ignorância se não supero permanentemente a minha”.
“Não posso ensinar o que não sei.”
(FREIRE, 1996, p.95)


Para saber mais sobre o assunto.
Brasil MEC/SEF. Proposta Pedagógica e currículo em Educação Infantil. Brasília: 1998.
Brasil MEC/SEF. Referencial Curricular para Educação infantil. Brasília: 1998.
Brasil MEC/SEF. Ministério da Educação e do Desporto. 1998. Parecer CEB/CNE 022/98 Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. 1998.
Brasil MEC/SEF. Ministério da Educação e do Desporto. Parecer CEB/CNE 04/2000. Diretrizes  Operacionais para Educação Infantil. 2000
KAMII, Constana. A Criança e o número: Implicações Educacionais da Teoria de Piaget para a atuação junto a escolares de 4 a 6 anos. Campinas: Papirus, 1990.
KISHIMOTO, Tisuko M. (orgs). Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. São Paulo: Cortez, 2008.
LIMA, Reginaldo Naves de Souza; VILA, Maria do Carmo. Matemática. Contactos Matemáticos do Primeiro Grau. De risco a curva, desta a reta. De retas o plano. Cuiabá: EdUFMT, 2003.
MACEDO, L. A. A Importância dos Jogos para a Construção do Conhecimento na Escola. 1994 (mimeo)
MORI, Iracema. Viver e Aprender Matemática. 2ª série. São Paulo: Saraiva, 2004.
MOURA, M. “A Séria Busca no Jogo: do lúdico na matemática” In: KISHIMOTO, T. T. M. (Org.) Jogo, Brinquedo, Brincadeira e Educação. São Paulo: Cortez, 1977.
NACARATO, Adair Mendes. et al. A matemática nos anos iniciais do ensino fundamental. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.
PIAGET, Jean. A formação do símbolo na criança: imitação, jogo e sonho, imagem e representação. Rio de Janeiro: 1975.
SMOLE, Kátia Stocco. et al. Cadernos do Mathema, jogos de matemática de 1° a 5° ano. Porto Alegre: Artmed, 2007.
STAREPRAVO, Ana Ruth. Jogando com a matemática: números e operações. Curitiba: Aymará, 2009.

SITES:


Texto: Profa. Andréa Limones de Oliveira.
Pós-Graduanda em Psicopedagogia Institucional pelo INEC/UNICSUL.

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Forte abraço.
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