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quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Peronismo – Parte 4: o segundo período presidencial (1951-1955).

Para entender a história... ISSN 2179-4111. Ano 1, Volume set., Série 22/09, 2010.


Diversamente do primeiro período presidencial, o segundo, iniciado em fins de 1951, foi marcado por uma grande crise econômica gerada pelos mais diversos fatores.
Ficou evidenciado o gigante peronismo com pés de barro, ou seja, uma estrutura frágil.
A recuperação industrial da Europa acabou com a pequena e nascente indústria argentina, a qual na verdade sempre sofreu problemas de infra-estrutura.
O governo Perón tentou solucionar a questão em 1952, mas os problemas derivaram da falta de uma indústria pesada adequada e do atraso tecnológico, principalmente no setor da energia e combustível.

Uma crise anunciada.
Durante anos o equipamento industrial, agropecuário e energético argentino sofreu um constante desgaste, os diversos setores não se modernizaram, enquanto os países europeus reconstruíram sua capacidade produtiva com a tecnologia mais moderna existente.
A indústria argentina passou a enfrenta grandes dificuldades, sentindo a falta de uma indústria pesada em seu próprio país, obrigada a comprar máquinas dos EUA a valores.
Devido à concorrência européia, os industriais argentinos só conseguiam vender sua produção em quantidade reduzida no exterior, sendo forçada a reduzir constantemente os preços.
A este contexto se somava um aumento dos gastos com a mão de obra, encarecendo os custos e reduzindo ainda mais a produtividade.
O governo peronista nada pode fazer para enfrentar a situação.
As reservas monetárias haviam acabado, tinham sido gastas em grande parte com as nacionalizações realizadas durante o primeiro período presidencial.
Dessa forma as subvenções ao consumo começam a se tornar um fardo para o governo.
A poupança interna se mostrava insuficiente, a inflação crescia, e, com ela, o desemprego.
Agravando todo este quadro, a Argentina enfrentou duas colheitas ruins seguidas.
O mercado interno se contraiu e a indústria entrou em queda desenfreada, os índices de desemprego chegaram a taxas perigosas.
O capital externo temendo investir no país, especialmente em determinadas áreas, fez sentir-se, deixando as empresas sem terem como captar recursos e, por fim, fazendo várias delas quebrarem.
O IAPI (Instituto Argentino de Promoção do Intercâmbio), órgão estatal, que monopoliza o comércio exterior de cereais, o qual durante o primeiro período presidencial havia obtido ganhos extraordinários, logo passou a acumular prejuízos.
No caso, estava obrigado a comprar colheitas a um preço superior ao do mercado internacional, passando a não ter mais condições de financiar outras atividades econômicas e muito menos o consumo.

Conseqüências da crise econômica.
Os vários fatores aglutinados em torno das questões estruturais, geraram na Argentina a impossibilidade do pagamento de salários mais elevados que pudessem fazer a economia girar, criando um circulo vicioso.
A inflação afetou não só a classe média, como também as camadas populares da cidade e do campo.
Os salários nominais dos trabalhadores forma congelados, representando uma queda no salário real.
Os índices do produto bruto, da participação industrial e do capital por habitante, permaneceram em 1955 nos mesmos patamares que em 1948.
Assim, Cresceram as reivindicações populares, justamente, em momento em que difícil o governo não tinha como atendê-las.
Tentando amenizar a situação, a CGT (ala trabalhista do partido peronista), procurou estimular a formação de mecanismos de assistência própria.
No entanto, estimulados pelas próprias empresas nacionais, estouram manifestações contrarias ao congelamento de salários por todos os lados.
A resposta do governo foi um forte aumento da repressão.
A ordem do governo peronista passou a ser produzir para o engrandecimento da nação e não fazer greves reivindicatórias.

A morte de Eva Perón e a aproximação com os EUA.
À medida que o prestigio de Perón declinava, sua vida pessoal também sofria perdas significativas, a maior dela aconteceu em 1952, foi quando morreu sua companheira Eva Perón.
Evita faleceu de câncer aos 33 anos, mais tarde sua figura terminaria se tornando símbolo da ala esquerda do movimento peronista.
O marido apaixonado mandou embalsamar o corpo da esposa, o que acabaria acarretando em uma peregrinação forçada do cadáver por diversas partes do mundo.
Devido à crise econômica, junto com a morte de Eva Perón, a orientação peronista também morreu.
 O governo mudou sua atitude com relação às empresas estrangeiras e grandes potências mundiais, aproximando-se da orbita de influência norte-americana.
Já em 1947, a Argentina havia sido praticamente obrigada, devido a pressões dos Estados Unidos, exercidas no Tratado do Rio de Janeiro, a assinar um compromisso de cooperação político-militar.
Em 1950, os argentinos conseguiram obter do “Export and Import Bank” um crédito de cento e vinte e cinco milhões de dólares, o que amenizou a crise e garantiu a Perón prosseguir no comando do país por mais alguns anos.
Em 1953, o país recebeu a visita da missão norte-americana, presidida pelo próprio presidente Eisenhower.
Foram fixadas então as bases de um crescente entendimento entre os governos da argentina e dos EUA.
No mesmo ano de 1953, uma nova lei legalizou concessões extremamente favoráveis as empresas estrangeiras.
O governo peronista fez concessões às empresas norte-americanas nos ramos automobilísticos e petrolíferos.
Cabe notar que o ramo petróleo foi uma das raras exceções, na questão da nacionalização, pois o peronismo nunca cogitou nacionalizar o setor, o qual sempre se manteve uma concessão norte-americana.
O nacionalismo havia se esgotado em si mesmo, tornava-se cada vez mais evidente a penetração norte-americana na Argentina, o que por si demonstrava que o governo peronismo estava chegando ao fim.

O começo do fim.
O peronismo terminou por desarticular-se, traiu os seus próprios princípios e atropelou a si mesmo, rompendo com sua base de apoio.
Perón golpeou e irritou os diversos grupos sociais sobre os quais se equilibrava, gerando um clima de insegurança geral.
Entretanto, apesar da crise e da aproximação com os EUA, os peronistas passaram a alimentar a esperança de formar um bloco de poder político e econômico com Chile e Brasil (então ainda sob o governo Vargas, o qual havia a pouco retornado ao poder através do voto).
Segundo as próprias palavras de Perón, este bloco deveria formar “a unidade econômica continental, ou melhor, a formação de uma confederação latino-americana, na qual evidentemente, os Estados Unidos da América teriam de ficar a parte”.
Para ele, havia “chegado o momento de paralisar a tentativa de desagregação do pan-americanismo, por uma reiteração da fidelidade ao passado”.
Não obstante, Perón fez declarações que desestabilizam a possibilidade desta união, demonstrando uma total insensibilidade para assuntos externos, ferindo a soberania nacional brasileira e chilena.
A população do Brasil e Chile sentiu-se constrangida, incitada a manifestar-se contrária a uma união econômica com a Argentina, devido a sua pretensão hegemonia sobre seus parceiros.
Por essas e outras, começaram a ser planejadas conspirações para derrubar o governo Perón.
Em 1955 eclodiu um conflito direto com a igreja, que serviria como estopim que daria inicio a queda de Perón.

O conflito com a igreja católica.
Poderia parecer que um desentendimento do peronismo com a igreja católica em nada poderia afetar a estabilidade do governo, mas nos países de colonização espanhola, como na própria Espanha, os clérigos possuíam grande influência política e econômica.
A religiosidade da população fazia com que a voz da igreja fosse ouvida a acatada.
Acontece que a igreja católica na Argentina era proprietária de grandes extensões de terras, como em muitos outros países latino-americanos, era um dos maiores latifundiários do país.
Uma questão que entraria na pauta do governo peronista em breve.
Inicialmente, a raiz do desentendimento esteve ligada a uma proposta de separação entre Igreja e Estado.

A situação foi gravada com a revogação da lei do ensino religioso obrigatório, bem como com a implantação da lei do divorcio.
Os peronistas tentavam transformar a Igreja como bode expiatório pela crise que se intensificava.
Por outro lado, a igreja, ressentida com as medidas tomadas contra ela, culpava os peronistas pela crise, mobilizando a sociedade argentina contra o governo.
Assim, a procissão de “Corpus Christi”, de 11 de junho de 1955, terminou convertendo-se em ato político, ultrapassando os limites religiosos, um marco na luta contra o peronismo.
A Igreja, uma das maiores beneficiadas pelo peronismo, e por isso um de seus principais sustentáculos, liderou a conspiração anti-peronista.

O golpe militar que derrubou Perón.
No mesmo dia 11 de junho de 1955, em que a igreja se manifestou contra o peronismo, teve lugar uma tentativa frustrada de bombardear a casa do governo e a Praça de Maio, em Buenos Aires.
O número de mortos foi elevado, mas o exército salvou momentaneamente o governo peronista, embora o equilíbrio do poder estivesse definitivamente rompido.

O apoio durou pouco, em 16 de setembro de 1955, os militares acabaram aderindo significativamente ao movimento, organizando um levante armado.

Foi na cidade de Córdoba que a rebelião começou, liderada pelo general Lonardi, futuro presidente argentino.
O exercito marchou em direção a Buenos Aires.
Diversos setores da sociedade, temendo que a crise econômica pudesse propiciar uma revolução socialista, apoiaram o golpe.
Um dos fatores responsáveis pela subida de Perón ao poder, também causou sua queda.
Em 22 de setembro de 1955, devido à chamada “Revolução Libertadora”, Perón renunciou.
Apesar de possuir grande número de tropas fiéis a sua causa, bem como elevada porcentagem de operários que se dispunham a lutar por ele, temendo que o país terminasse se tornando comunista através de uma revolução popular, descartou qualquer possibilidade de luta civil.
Perón dirigiu-se ao exílio, primeiro no Paraguai, depois na República Dominicana, para finalmente se instalar na Espanha do General Francisco Franco.
O ditador fascista argentino caiu, mas o peronismo continuou vivo.
Mesmo no exílio, Perón manteve voz ativa na política argentina, constituindo um dos casos mais singulares da história mundial.

Para saber mais sobre o assunto.
Acompanhe os próximos artigos na Revista.

Texto:

Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.
Doutor em Ciências Humanas - USP.
MBA em Gestão de Pessoas - UNIA.
Licenciado em Filosofia - FE/USP.
Bacharel em Filosofia - FFLCH/USP.




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Forte abraço.
Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.

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